[Akitando] #119 - Rant: Aprendizado na Beira do Caos | Rated R

2022 May 30, 10:33 h

DESCRIÇÃO

Finalmente chegamos na marca de 300 mil assinantes no canal! E hoje vai ser mais um video de Rant, Rated R, onde quero só falar livremente sobre minhas pesquisas e hipóteses sobre uma teoria geral sobre os princípios de aprendizado, gestão, empreendedorismo e qualidade. Vai ser uma longa conversa metafísica que costuma ser assunto de minhas conversas de bar. Vamos tentar falar sobre isso sem o efeito de álcool. Vai ser meio bizarro, mas aguentem firme.

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Olá pessoal, Fabio Akita

Minha voz anda ruim esses dias, mas decidi gravar assim mesmo, espero que não incomode. Este video é pra comemorar os 300 mil assinantes do canal. Obrigado a todos que acompanham e quem é recém chegado, os videos deste canal foram feitos pra serem assistidos desde o começo. Não tem videos opcionais aqui. Se você tem uma pergunta, eu provavelmente já respondi antes. Enfim, já faz muitos episódios que eu só tenho abordado temas bem técnicos, e sendo honesto até pra mim é cansativo editar tanto detalhe de conceito técnico então resolvi dar uma pausa hoje pra falar de alguns assuntos que estudei por muitos anos mas ainda não discuti no canal. O assunto vai ser sobre como eu penso sobre aprendizado. Uma teoria mais geral sobre aprendizado.

Este video é pra todos vocês que já me perguntaram, “Akita, como eu devo estudar?” ou “Akita, como devo gerenciar um projeto?” ou “Akita, como devo administrar uma empresa?” Impressionante, que apesar de eu já ter falado diversas vezes que vocês não deveriam estar fazendo essas perguntas pra mim nem pra nenhum outro influencer, elas continuam aparecendo. Mas hoje eu quero tentar ensinar a fundação de como vocês mesmos podem tentar responder essas perguntas.

Já deixo avisado logo de cara que quase tudo que vou contar vai soar como auto-ajuda, coaching e tudo mais. A diferença é que não estou vendendo nada. O problema é que assuntos como aprendizado, gestão, empreendedorismo, são abstratos por natureza. Não existem definições exatas e objetivas pra nenhuma delas. Por isso cada um precisa ter uma imagem na cabeça, um modelo pra encaixar na realidade. O que vou contar agora não é a resposta definitiva nem nada disso. É só a forma como eu penso sobre esses assuntos. Alguns de vocês talvez já tenham imagens diferentes na cabeça, e não tem nenhum problema. Vocês queriam saber como eu penso, bem, eis como eu penso.

(...)

Lógico, sei que não importa quantas vezes eu disser que é perda de tempo fazer perguntas como “Akita, o que eu devo fazer da minha vida”, é da natureza humana querer uma resposta fácil, resultados fáceis. Consigo simpatizar com a idéia de imaginar “cara, esse sujeito parece ter sucesso, vou perguntar pra ele como que ele fez, daí é só copiar”. Existem milhões de coisas simples que conseguimos achar respostas fáceis. Como faz pra fazer um ovo cozido com gema meio mole? Procura no Google, e descobre que é só deixar exatamente 7 minutos em água fervente.

Se pra achar como cozinhar um ovo é tão fácil, por que tudo não pode ser assim fácil? Aliás, dá pra extrapolar bastante. Se quero viajar, basta colocar o destino no Waze ou Google Maps, e ele consegue me estimar com bastante precisão o tempo que vai levar pra chegar. De novo, parece fácil. E posso ficar o resto do dia só elencando exemplos de coisas que você não sabe, mas com uma rápida pesquisa no Google, eu acho a resposta e vai ser até bem exata.

Se eu consigo achar respostas tão fáceis pra coisas como achar um trajeto no Waze, por que não consigo achar qual o melhor caminho pra estudar? Ou qual a melhor forma de gerir um projeto que vai ser barato e acabar rápido? Ou qual a forma mais eficiente de administrar uma empresa? Ou simplesmente, como ter sucesso na vida? Por que diabos o Google não consegue me dar essa resposta? Será que é só questão de tempo até a tal da inteligência artificial e machine learning melhorarem um pouco mais?

No fim das contas, por trás de todas essas perguntas que me fazem, elas podem ser reduzidas só a essa mais simples: “Akita, como eu faço pra ter sucesso na vida?” Cara, todo coaching vai te vender que sabe como. E se você for bem trouxa ou muito desesperado, vai cair que nem um pato. Mas como eu não tenho paciência pra isso já digo logo de cara: nem eu, nem ninguém sabe essa resposta e nem nunca vai saber. Nem se juntar todas as cem pessoas consideradas de maior sucesso do século XXI na mesma sala e mandar eles escreverem uma lista de procedimentos. Ninguém vai conseguir seguir e ter o resultado esperado. E intuitivamente a maioria de vocês assistindo já sabem disso, mas por que exatamente?

Foi fazendo essa pergunta que eu me interessei em estudar mais um pouco sobre conceitos de outras áreas. E se você ler demais vai começar a entrar em filosofia e em diversos outros campos. Apesar de achar filosofia clássica chata pra caralho, obviamente tem coisas interessantes a considerar. É fazer as perguntas difíceis, aquelas que todo mundo vai responder “ah, isso é óbvio”, mas se pedir pra detalhar, ninguém consegue colocar em palavras. Deixa eu pegar um exemplo super simples. Lembra as aulas de física básica que você teve no colégio? Lembra daquela formulinha besta de S = v x t? Ou espaço é igual a velocidade vezes o tempo?

Com essa fórmula, se eu estiver num carro a uma velocidade média de 100 quilômetros por hora, e dirigir por exatamente 2 horas, significa que no final vou ter percorrido 200 quilômetros. Você já parou para pensar a implicação disso? Não só dessa mas de todas as fórmulas que aprendeu no colegial? Com tudo que Newton descobriu e documentou no que chamamos de “física clássica” eu não consigo só prever onde meu carro vai estar daqui 2 horas, mas até a órbita de planetas do sistema solar. Dá pra prever onde Marte vai estar em relação à Terra daqui 20 anos, e dá pra saber onde estava 20 anos atrás. Essas fórmulas descrevem o presente, confirmam com os dados vistos no passado e conseguem prever o futuro! Já parou pra pensar nisso?

Um século atrás isso levantou várias questões filosóficas e morais. Aqui eu posso estar sendo simplista porque realmente não sou estudante de filosofia, mas se começar a pensar no que acabei de explicar vai cair no ramo da filosofia conhecida como Determinismo, que na real teve sua origem na Grécia antiga, 7 ou 8 séculos antes de Cristo, época dos primeiros e verdadeiros “influencers”, como Aristóteles. Mas no Ocidente ela é associada com a física clássica de Newton e a busca pelas leis e fórmulas que descrevem a realidade como algo estático e previsível. Vocês entendem a implicação das fórmulas? Se eu tenho na fórmula todas as variáveis que causam um efeito, como velocidade e aceleração, e se eu consigo extrapolar a variável de tempo pro futuro, e se o resultado tem que bater com a realidade, então em essência, estou prevendo o futuro.

Por um lado isso parece extremamente agradável, se a pesquisa continuar e conseguirmos desvendar todas as leis da natureza, quem sabe, não existe uma fórmula mágica, determinista, de como ter sucesso? Por outro lado, se parar pra pensar no lado moral, se essas leis realmente existem, o que isso diz sobre coisas como nosso livre arbítrio? Na realidade a gente não tem agência sobre nós mesmos? Se é possível existir leis que prevêem o futuro, então tudo que estamos fazendo agora, neste minuto, eu gravando este video, ou vocês aí assistindo, não são escolhas que fizemos mas sim passos já pré-destinados que não temos nenhum controle? Será que existe uma fórmula pra isso que a gente só não descobriu ainda?

Na realidade, não. No século XX as chamadas Leis de Newton foram quebradas, caso vocês não saibam. Elas não eram bem “leis”. É por isso que as pessoas tem dificuldade de confiar na ciência. Por um lado mantemos a “Teoria da Evolução de Darwin” ainda como “Teoria” sendo que na verdade já tem bases mais que suficientes pra ser promovida a Lei. E eu sei que alguém já tá indo nos comentários pra discordar, mas esquece, só aceita que dói menos. Mas por outro lado, as “Leis” de Newton não são leis. Deixa eu explicar.

A física clássica de Newton funciona super bem pra fenômenos com dimensões que vão desde o átomo até o tamanho de algumas estrelas e planetas. Parece um escopo bem grande, mas não é o total, nem de longe. Essa mesma física que consegue prever com boa precisão onde meu carro vai estar depois de dirigir por um determinado tempo ou onde um planeta vai estar em relação à outra daqui alguns anos, falha miseravelmente em tamanhos ou densidades muito maiores que estrelas, particularmente quando falamos de coisas como buracos negros. Ela não consegue explicar da onde vem a gravidade. E falha miseravelmente em tamanhos muito menores que o átomo, o mundo sub-atômico da física quântica.

No campo cosmológico, Einstein nos trouxe a Teoria Geral da Relatividade e a Teoria Especial da Relatividade. Na prática, a física clássica de Newton é um caso especial, simplificado, da Relatividade. Ou seja, das teorias de Einstein você consegue derivar física newtoniana pra dimensões “pequenas” onde o espaço-tempo parece estático e linear. Quando falamos em escalas de quilômetros, Newton funciona, por isso ainda aprendemos na escola. Mas quando falamos de escalas de anos-luz, velocidade da luz, aí precisa de Einstein. Mesma coisa quando falamos de efeitos quânticos, não dá pra prever onde uma sub-particula vai estar usando Newton.

Literalmente não dá realmente pra prever onde uma sub-particula vai estar porque no mundo quântico falamos em espaços de probabilidades. Ela pode estar na direita, mas também pode estar na esquerda. As diferentes respostas existem ao mesmo tempo em superposição e só vamos realmente saber exatamente onde depois que colapsarmos o sistema. O mundo quântico não é determinista. A gente sempre acha que toda causa tem um efeito. Mas no mundo quântico temos uma gama de probabilidades. Incerteza e aleatoriedade passam a fazer a diferença. E descobrimos que Deus joga dados. Nada é sagrado, nem as Leis de Newton.

E como eu sempre aviso: cuidado pra não cair em papo de coach quântico. Como o nome diz, física quântica só se aplica no mundo quântico, sub-atômico. Mas o ponto é que até o colegial, você só aprendeu a encarar a natureza como se fosse algo determinista, causa e efeito, segundo as Leis de Newton, que por coincidência corroboram visões antiquadas de destino ou algum tipo de força maior te guiando num caminho pré-definido. Por intuição, na cabeça de muitos, ou existe uma fórmula mágica determinista pra alcançar algum tipo de sucesso, ou na verdade, você está pré-destinado a não ter sucesso e só aceita isso. E a resposta é bem mais complicada do que isso.

Onde eu quero chegar é primeiro fazer vocês entenderam o seguinte: atividades curtas, em dimensões de seres humanos como um ingrediente de cozinha, ou em tempos curtos com poucas variáveis, como a duração de uma viagem pra uma cidade vizinha, existem sim, fórmulas Newtonianas, que conseguem prever como partir de um ovo cru e chegar em um ovo com gema cremosa em 7 minutos. E se o destino da sua viagem fica a 200 quilômetros daqui, se conseguir manter uma velocidade média de 100 quilômetros por hora, vai chegar em aproximadamente 2 horas. Ordens de grandeza muito diferente disso, nem machine learning, nem inteligência artificial, vão conseguir ajudar. Tudo passa a ser uma probabilidade.

Aleatoriedade é um campo inteiro de pesquisas que levam a física do Caos. Pequenas variações iniciais que pareciam insignificantes e podem levar a grandes efeitos difíceis de prever. É uma das razões de porque apesar de todo o poder computacional que nós temos, até hoje é impossível prever a meteorologia com precisão, todos os dias do ano, sem errar. Conseguimos sim, ter uma noção geral, mas nunca vamos acertar como exatamente vai estar o tempo daqui exatamente 1 ano. Não digo no mesmo mês de daqui um ano, mas se vai estar chovendo ou não no dia 1o de junho do ano 2033, volume exato de precipitação entre quais horários. É impossível, e se acertarmos não vai ser porque previmos, vai ser sorte ou coincidência.

Tudo isso que falei foi pra concluir o seguinte: sim, pra coisas com tempo de duração relativamente curto, é possível ignorar muitas dessas variáveis e aleatoriedade, e conseguir seguir um conjunto de passos que te leva de algo simples como um ovo cru pra um ovo cozido decente. É um período de tempo e dimensões onde conseguimos reduzir objetivos a passos deterministas. Porém, estique pra um período de tempo maior, e de repente variáveis que estávamos ignorando começam a aparecer e a dar efeito, até perdermos o controle. Pra todos os efeitos e propósitos, toda receita funciona pra coisas pequenas na dimensão de horas ou dias, mas nunca anos ou décadas, e pra todos os efeitos e propósitos, considere que é impossível ter uma receita determinista, repetível, de como ter sucesso na vida ou mesmo num projeto curto. Quanto mais complexo o objetivo e mais tempo for necessário, mais a aleatoriedade vai quebrar toda fórmula e todo planejamento.

Entenderam? É impossível prever o futuro. Os deterministas newtonianos perderam faz mais de um século já, desde quando descobrimos Relatividade, Física Quântica e Teoria do Caos. Por um lado, não perdemos nosso livre arbítrio. O futuro é incerto e suas decisões afetam o futuro, portanto você é responsável por elas. Mas por outro lado, é seguro dizer que é impossível ter uma receita de sucesso. Mas, cuidado, não é a mesma coisa dizer que estamos totalmente à mercê da aleatoriedade. Isso também nos tira livre arbítrio. O futuro não depende de só ter sorte ou ter azar. Na realidade ela depende das suas decisões somado a ter sorte ou azar. Se tudo fosse só aleatório, nós estaríamos vivendo em caos total. Mas você sabe que não é verdade. Então deixa eu explicar o que é a realidade.

Imagino que estejam confusos. Lembra em episódios passados do Guia de Aprendendo a Aprender ou o que Cursos não tem ensinam? Eu disse que todos vocês sofreram lavagem cerebral a vida inteira. Até se formar no colégio sua vida toda foi pré-determinada. Você sabia passo a passo o que vinha pela frente. Toda matéria era explícita. Você podia escolher não estudar, mas só. De repente você cai no mundo real, e descobre que não tem matéria pré-definida, não tem prova bimestral, não adianta tirar 5. Você não repete mais de ano, mas mesmo assim parece que todo ano é uma repetição do mesmo fracasso anterior. E por isso fica desesperado tentando achar de novo uma receita, como tinha no colégio. Você é um junkie, viciado em passar de ano artificialmente como se isso representasse algum tipo de progresso.

Toda vez que vem à sua cabeça “vou perguntar a receita do sucesso” pra alguém, você está com a noção que existe uma fórmula determinista, uma fórmula newtoniana, pra ter uma carreira de sucesso, ou um projeto de sucesso ou uma empresa de sucesso ou sucesso em geral. Você acha que existe uma forma de seguir passos pré-definidos, algum segredo que ninguém te contou, mas que se conseguir achar, seguir, trabalhar duro todos os dias, garantidamente vai atingir esse sucesso.

E eu contei toda essa história pra te confirmar o que você já sabia mas não queria admitir: esse segredo não existe. E só trabalhar duro não te garante absolutamente nada. Vou repetir: só trabalhar duro, sem método, não adianta nada. Na verdade, até tem um tipo de “segredo” sim, mas você provavelmente não vai acreditar que funciona. Na verdade é irônico que vocês preferem acreditar numa mentira bonita do que numa verdade inconveniente. Antes de chegar nela vou precisar contar outra história pra vocês que começa com um outro tema relacionado, chamado “qualidade”.

A primeira vez que parei pra pensar no termo qualidade, foi numa matéria eletiva na faculdade, lá no meio dos anos 90, alguma coisa sobre Qualidade Total. E eu quero que vocês parem dois segundos pra pensar: vocês conseguem definir a palavra "qualidade"? O que significa alguma coisa ter qualidade? Pra alguns, qualidade significa "ter muitas funcionalidades". Pra outros significa "ter a menor quantidade de defeitos". Também pode significar "o que deixa o cliente mais satisfeito". Você consegue pensar numa definição não-ambígua, objetiva, que teria consenso de todo mundo? Acha que é possível?

Qualidade, assim como aprendizado, empreendedorismo, gestão, sucesso, é outro termo abstrato e subjetivo. O que pra mim parece ser de qualidade, pra outra pessoa pode ser o oposto. Um exemplo bobo é uma coisa que quem me segue no insta já me viu reclamando. Pra grande maioria das pessoas aqui no Ocidente, o que você encontra de sushi num buffet de churrascaria é de excelente qualidade. Inclusive, quanto mais cream cheese, mais qualidade parece ter. Não é isso? Agora, pra mim, e pra maioria dos Orientais, um sushi com cream cheese faz todos os melhores sushiman que já existiram no Japão virar nos seus caixões de desgosto. E o ponto é que no contexto de Ocidente, eu provavelmente estou errado: se existe demanda, provavelmente a qualidade não é zero, especialmente na definição que falei antes de "o que deixa o cliente mais satisfeito". Se o cliente tem mau gosto, quem sou eu pra julgar.

Mas deixa eu voltar um pouco na história. No fim dos anos 70, começo dos anos 80, o mundo Ocidental se viu numa encruzilhada estranha. Assistam este trechinho do filme De Volta pro Futuro 3, que saiu no fim dos anos 80.

(... trecho)

Esse trecho é da hora, porque o Doc versão de 1955 fica chocado quando o Marty de 1985 fala que componentes eletrônicos japoneses são os melhores, mas na visão dos anos 50, se um componente dava problema, obviamente era por ser japonês. Lembrem-se, em 1945 o Japão perdeu a 2a Guerra Mundial, foi tomada pelos americanos, proibida de se armar de novo, e teve que reconstruir o país, depois de ter tomado duas bombas nucleares no rabo. Fazer o que, meio que mereceu. Mas o resultado é que o país inteiro ficou totalmente quebrado. Imagina reconstruir um país não do zero, mas do negativo.

Em pouco mais de 30 anos, só 3 décadas, ela foi de um país devastado que não conseguia produzir nada de qualidade, pra chegar nos anos 80 com os melhores produtos eletrônicos do mundo. Pra você que é novo, quanto é 30 anos? Se contar de hoje, é mais ou menos a partir dos anos 90 pra cá. Alguns podem achar que é pouco tempo, outros que é muito tempo, mas considere que essa é mais ou menos a idade da internet comercial. Nesse período nós evoluímos de todo mundo fazer ligações telefônicas de orelhão, pra quase todo mundo ter um computador ligado na internet no bolso. 30 anos é o tempo da minha carreira inteira.

Mas o ponto é que quando chegamos nos anos 80, pela primeira vez os Estados Unidos realmente ficaram com medo da invasão de produtos japoneses. Outro fator, foi na Inglaterra que começou a Revolução Industrial no fim do século 19. E nos anos 80 foi quando pela primeira vez ela tava importando mais produtos manufaturados do que exportando. E o Oriente, liderado pelo Japão, tava causando uma invasão inesperada, mas em vez de uma invasão de mísseis e explosivos, era uma invasão no sistema econômico, via produtos de consumo de alta qualidade e mais baratos que da concorrência.

E não só do Japão, mas de outros países orientais que ficaram conhecidos como os Tigres Asiáticos, incluindo Cingapura, Coréia do Sul, Hong Kong, Taiwan. Enquanto os Estados Unidos ficaram perdendo tempo com a Guerra do Vietnam e com a recessão até os anos 70, os asiáticos cresceram monstruosamente. Tudo bem que logo depois, o Japão meio que se fodeu com o estouro da bolha imobiliária e a grande recessão nos anos 90 que se segue até hoje. Essa foi a primeira década perdida deles. E nós notamos isso quando as marcas mais reconhecidas de produtos asiáticos eram Sony, Mitsubishi, Toyota, Honda e agora são Samsung, LG, Xiaomi, Huawei.

Mesmo assim, no começo dos anos 80 tava claro que o Ocidente precisava se modernizar. E por isso todos os olhos se voltaram pra Ásia, em particular, pro Japão. Que diabos eles estavam fazendo que conseguiam produzir produtos de alta qualidade em larga escala a preços baixos? Os governos e empresas ocidentais estavam realmente determinados a quebrar esse código. Eles mandaram pesquisadores e delegações pro Japão pra entender esse fenômeno. Nunca é um único fator. Tem o contexto histórico, tem a diferença cultural, tem até fator sorte. Por isso nunca acredite numa única resposta mágica que seja bala de prata.

Mas uma das coisas que eles descobriram, mais próximo de uma receita, foi o tal Modelo Toyota de Produção ou TPS. Esse modelo descreve o funcionamento e filosofia de uma fábrica inteira, não só a linha de produção, mas desde a contratação até a evolução das pessoas. O Ocidente se focou mais em técnicas, como o sistema de pull em vez de push, pra evitar desperdícios, que muitos de vocês já devem ter ouvido falar, o tal do Kanban. E o conceito que é o coração de praticamente toda metodologia que surgiu depois disso, o ciclo de melhoria contínua conhecido como Kaizen.

No começo dos anos 80 foram publicados vários livros relacionados mas tem 2 que preciso mencionar. O primeiro foi o famoso livro Out of Crisis, ou Saindo da Crise, do Dr. Edward Deming, famoso pelo ciclo PDCA que é similar ao modelo Kaizen da Toyota. PDCA pra quem nunca viu, é o ciclo básico de Planejar, Fazer, Checar, Ajustar e repetir. Já falo mais sobre isso mas esse livro tornou famoso os 14 pontos de gerenciamento de Deming como: criar constância de propósito, ou parar de depender de inspeção pra ter qualidade. Todo mundo que tem posição de gerência precisa pelo menos saber o que são esses pontos. Alguns são óbvios e ninguém faz direito até hoje, justamente porque ignora a história. Vou deixar um link com o resumo dos 14 pontos na descrição abaixo.

O segundo livro eu vejo coaches porcaria falando dele até hoje. É sobre o TOC, ou Teoria das Restrições do Dr. Goldratt. O livro onde ele apresenta essa teoria é o "The Goal", publicado em 1984, no formato de uma novela, uma historinha mesmo, de um cara trabalhando numa fábrica e otimizando processos. Em resumo muito resumido ele fala sobre a idéia de resolver um problema de cada vez, a analogia de "qual é a força total de uma corrente?" E a resposta correta é "a força do elo mais fraco". Portanto conserte o elo mais fraco primeiro. Mas agora outro anel vai se tornar o elo mais fraco, então conserte ele. E vai indo um anel de cada vez. É outra forma de explicar melhoria contínua.

Mas mais influente do que todos eles, acho que foi a Motorola por volta de 1986. Ela também foi afetada pela invasão japonesa e conseguiu dar a volta por cima criando uma nova metodologia que chamou a atenção de diversas outras empresas como a poderosa General Electric, de Jack Welsh. Foi a metodologia Six Sigma, que tem como objetivo fazer o processo de fabricação não produzir mais que 3.4 DPMOs ou 3.4 defeitos por milhão de oportunidades. Essa metodologia é bem mais detalhada, densa e tratada praticamente como uma doutrina que deve ser seguida à risca. Se você acha engraçado uma posição como scrummaster hoje em dia, Six Sigma tem faixas pretas e faixas verdes. E eles levam a sério saporra.

Se pra você um CEO influente é alguém como Elon Musk ou Jeff Bezos, nos anos 90 só se falava de Jack Welsh da GE. A Motorola inventou isso de Six Sigma mas foi a GE que tornou ela famosa. O objetivo era esse mesmo: como aumentar qualidade e diminuir custos ao mesmo tempo? E os resultados da Motorola foram impressionantes na época. O objetivo deles era melhorar 10X ao longo de 5 anos e eles ainda aumentaram a aposta de melhorar pra ser 10X a “cada” dois anos ou 100X em quatro anos! E em 10 anos de 1987 até 1997 eles cresceram as vendas em 5 vezes, lucros de 20 porcento ao ano, economia de uns USD 14 bilhões, e os preços das ações da Motorola subiram pra uma taxa de mais de 21 porcento ao ano.

Era isso que a gente lia nos anos 90. Mas olhando agora de 2022, obviamente você pode ver que nem mesmo os criadores do Six Sigma tiveram sucesso por tempo indeterminado. Quantos de vocês tem algum produto da Motorola hoje em dia? Não só isso, em paralelo, eu falei do tal Modelo Toyota, que todo mundo de gestão de desenvolvimento de software adotou também, o tal de Lean. Povo startupeiro ficou doido com o Lean Startup do Eric Ries em 2009, inspirado no mesmo Lean da Toyota. Mas se era tão bom assim, era pra gente estar vendo muito mais produtos Toyota ou Motorola hoje em dia, não? Cadê?

Vários autores já tentaram responder a essa pergunta como Clayton Christensen e seu famoso livro The Innovator’s Dillemma, ou O Dilema do Inovador. Ou Chan e Renée no livro The Blue Ocean Strategy. De novo, variáveis imprevisíveis que a fórmula não tem como prever, somado a um comportamento de sentar em berço esplêndido, em bom português, achar que já ganhou e desacelerar até concorrentes menores e mais motivados passarem na sua frente. Ou condições de mercado imprevisíveis como crises aparecerem quando você não tava preparado. Ninguém consegue prever o futuro e muitas vezes você fracassa mesmo, mesmo achando que sabe tudo.

O Ocidente se assustou com o Japão nos anos 80 mas ao longo dos anos 90 e 2000 eles aceleraram e alcançaram patamares semelhantes, daí tivemos a recessão do mercado japonês, e o surgimento do milagre Chinês no século XXI. O mundo não é estático e ninguém está de braços cruzados esperando. Todo mundo já já superou esses métodos. Mas isso não quer dizer que o Modelo Lean ou o Six Sigma são ruins, só quer dizer que a geração de administradores depois dos criadores dos modelos originais fracassaram em continuar evoluindo o método, pelo menos fracassaram em andar rápido o suficiente pra não ficarem pra trás.

Eu trago esses casos porque hoje em dia todo mundo vai encontrar um monte de jargões e conceitos que nasceram nos anos 80 mas todos repetem e usam sem entender porque. Enquanto o mundo de fábricas, manufatura e gestão empresarial em geral estava passando por essa revolução de qualidade ao longo dos anos 90, o mundo de desenvolvimento de software também estava passando por outras revoluções. A transição do mundo de mainframes e computadores inacessíveis para os microcomputadores nos anos 70 e 80 e depois a internet comercial dos anos 90 aos anos 2000. E não por acaso, nós pegamos inspirações no mundo de manufatura.

De onde veio essa idéia de Ágil que todo mundo fala hoje em dia? Da onde saiu esses rituais de planejamento, retrospectiva, sprints e Scrum? De onde veio essa idéia de desenvolvimento baseado em testes? Depois de estudar tudo que saiu dos anos 80 até hoje em gestão, eu penso que todo mundo chegou na mesma conclusão mais ou menos ao mesmo tempo. Alguns foram inspirados por autores como Deming, alguns copiaram uns aos outros mesmo, e alguns realmente pararam pra pensar no problema e naturalmente chegaram a soluções parecidas. Os princípios de todos eles são simples e qualquer um conseguiria chegar em conclusões semelhantes. E chegaram, na real.

No coração do mundo Lean da Toyota está um princípio chamado Kaizen, ou melhoria contínua. Foi Deming quem definiu esse princípio em sua forma mais geral no chamado ciclo PDCA, que é sigla pra Planejar, Definir, Checar e Agir. No mundo da Toyota o conceito é que nenhum problema é resolvido permanentemente na primeira tentativa. Todo problema identificado deve dar origem a uma contramedida. E essas contramedidas podem ser de curto prazo, tipo um band-aid pra corrigir rápido, mas seguido de contramedidas de longo prazo, que buscam resolver o problema na raíz. Daí que vem técnicas como os famosos 5 Ps ou 5 porques. Deixa eu pegar um exemplo do livro.

Digamos que o problema identificado seja “as unidades de fabricação por hora estão abaixo da meta”. Por que? “Não conseguimos produzir peças suficientes por hora”. Por que? “Estamos perdendo oportunidades de produção”. Por que? “Perda de tempo”. Por que? “Perdas de tempo de ciclo”. Por que? “A carga da máquina leva muito tempo”. Por que? “O operador precisa caminhar um metro e meio pra ir pegar o material”. Opa. Esse parece ser a raíz do problema, e o que podemos fazer?

Dar um jeito de reduzir essa caminhada. Portanto, isso vai diminuir o tempo pra carga da máquina. Portanto, isso vai reduzir perdas de tempo de ciclo. Portanto, isso vai aumentar o tempo disponível. Portanto, isso vai aumentar as oportunidades de produção. Portanto, isso vai produzir peças suficientes por hora. Portanto, talvez consigamos atingir as metas de unidades de fabricação por hora.

Ou seja, temos o problema que estamos fabricando poucas peças por hora. A hipótese da raíz do problema é que o operador precisa caminhar demais toda hora pra pegar material e recarregar a máquina. Uma possível solução é trazer mais material pra perto do operador. Mas isso vai resolver de verdade? Só nos restar testar. Depois de um certo período de tempo, que poderíamos chamar de “sprint”, vamos verificar a quantidade de peças produzidas por hora e verificar se realmente voltamos a atingir a meta por hora. Se sim, podemos definir uma contramedida de longo prazo talvez colocando um armazém mais próximo com os materiais pra todos os operários. Se não, analisamos de novo e buscamos uma nova hipótese pra testar.

O que eu falei pareceu meio óbvio? Esse exemplo é da página 334 do manual de aplicação do Modelo Toyota. Um livro de 423 páginas. Isso não é o primeiro capítulo, é uma das partes finais do manual. O que eu acabei de explicar é o processo PDCA. Planejar uma contramedida que é diminuir o tempo de carga do operador. Realizar a contramedida que é estocar mais material próximo dele. Daí checar, medir o tempo médio de produção e validar que a meta foi atingida ou não. Finalmente, agir em estabelecer uma contramedida de longo prazo ou procurar outra possível raíz do problema. Resolveu? Então o elo mais fraco mudou pra outro elo, repete o processo e assim por diante.

No mundo Six Sigma não se fala de PDCA e sim de DMAIC, que é sigla pra Defina, Meça, Analise, Melhore, Controle. É um pouco mais específico no sentido que uma vez resolvido o problema, controle e garanta que o problema não se repita. Além disso as métricas também são estatisticamente mais exigentes, a começar pelo objetivo do nome: alcançar o nível Six Sigma que significa não mais que 3,4 defeitos por milhão de oportunidades ou 99,9997% de qualidade. Mas em princípio, PDCA e DMAIC são a mesma coisa.

Sabe o que mais é a mesma coisa? Um sprint de Scrum. Planeje as stories, trabalhe e programe, no final faça retrospectiva, revise as métricas, ajuste o processo, recomece outro sprint. Isso não é por acaso. Existe outro ciclo parecido que é a base da civilização moderna. Sim, o tal método científico que todo pseudo-cientista de Twitter esquece que existe. O método começa pela observação, que deve ser sistemática e controlada, a fim de que se obtenham os fatos científicos.

O método é cíclico, girando em torno do que se denomina teoria científica, a união do conjunto de todos os fatos conhecidos e de um conjunto de hipóteses testáveis. Os fatos, embora não necessariamente reprodutíveis, têm que ser necessariamente verificáveis. As hipóteses têm que ser testáveis frente aos fatos, e por tal, falseáveis. As teorias nunca são provadas e sim corroboradas. Se você está focado em tentar provar alguma coisa via algumas poucas evidências, você não está praticando o método científico, está só se inventando uma história.

Mais importante, o método científico é cíclico. Se a hipótese falhou, checam-se os novos fatos, ajusta-se a teoria, e verificamos as previsões de novo. A cada nova tentativa, aprendemos novos fatos. Melhoramos a teoria, continuamente. De novo, melhoria contínua, ou Kaizen. Todos os modelos ciclicos, PDCA de Deming, DMAIC de Six Sigma, Kaizen de Lean, Sprints de Scrum, MVPs de Lean Startup, tem em comum o fato de serem métodos de resolução de problemas desconhecidos. Eu iria um passo além e dizer que esse é o único método que conhecemos hoje pra resolução de qualquer problema desconhecido.

É meio anticlimático, mas eu falei que vocês talvez tenham dificuldade de aceitar que a única solução pra todos os seus problemas se chama literalmente “tentativa e erro”. Qual a melhor forma pra estudar? Tentativa e erro. Qual a melhor forma de gerir um projeto? Tentativa e erro. Qual a melhor forma de administrar uma empresa? Tentativa e erro. Qual a receita pra ter sucesso? Tentativa e erro.

Todos que tentaram seguir receitas, fracassaram. O mundo não é determinista nem newtoniano. A fórmula que você está procurando não existe. A coisa mais frustrante que existe no mundo corporativo até hoje, em particular com empresários amadores, é justamente essa idéia de trazer consultores com balas de prata, que ficam ali um, dois anos tentando implementar um monte de ferramentas e métricas, e no final o resultado é uma droga. É o mesmo problema do monte de gente confiando em cursos mágicos que garantem resultados irreais e achar que certificados garantem alguma porcaria. Todos vocês estão cometendo o mesmo erro, que foi o que a Toyota dos anos 80, a GE dos anos 90, a Apple dos anos 2000 conseguiram melhor que os outros: resolver um problema de cada vez e melhorando um passo de cada vez de maneira sistemática.

Óbvio, quando eu falo “tentativa e erro” não é só sair tentando qualquer coisa e se contentar com todos os erros. Tentativa e erro não é isso. Primeiro, é não errar a mesma coisa mais de uma vez. Isso tem que ser sistemático, é o ítem de controle do DMAIC de Six Sigma. Segundo, é testar logo, é a contrapartida de curto prazo de Lean da Toyota. Terceiro, é ter obcessão por evitar todo e qualquer tipo de desperdício, que é a raíz de toda metodologia de qualidade. Quarto, é não copiar ninguém, e sim identificar e resolver um problema de cada vez que você tenha, sistematicamente, disciplinadamente, obcessivamente, num nível de psicopata mesmo.

Isso me lembra um meme de desenvolvimento de software que alguns de vocês já devem ter visto alguma versão. Lembra os 5 Ps que falei antes? Por que vocês não escrevem testes pras novas funcionalidades? Porque não temos tempo. E por que não tem tempo? Porque tem muita coisa pra fazer e o sistema tem muitos bugs inesperados que nos atrasam. E por que tem tantos bugs? Porque o sistema não tem testes. E por que vocês não escrevem testes? Porque não temos tempo! - É impressionante que toda desculpa se resume a “não tenho tempo”. Quer uma novidade? Ninguém nunca tem tempo. A diferença entre eu e você é que eu não uso tempo como desculpa. Se tem uma coisa que todo mundo tem igual é tempo, a diferença é que alguns priorizam as coisas melhores do que outros. Por que vocês acham que um dos primeiros videos que fiz neste canal é justamente sobre priorização?

Se voltar pra você enquanto estudante. Tem milhões de coisas que você não sabe. E isso deixa você explodindo em ansiedade. Você gasta um tempo fazendo cursos ou seguindo tutoriais. Mas parece que não está evoluindo. O tempo passa, a quantidade de coisas que você não sabia parece que só aumenta. E no desespero começa a ouvir coaches e gurus vendendo cursos mágicos que prometem que vão te acelerar. E você vai na conversa.

Seja tentando descobrir como estudar, ou como gerir um projeto, ou como administrar uma empresa, você sempre entra num momento de desespero e tenta achar alguma fórmula mágica. Você tenta sair do caos e encontrar alguma ordem, seja lá qual ordem, pra tentar conseguir algum progresso. Ordem e Progresso. Eu pessoalmente sempre achei essa frase muito estranha. Ordem não leva ao progresso. Ordem no máximo mantém as coisas no mesmo lugar, o que não é progresso, mas o mais natural é que só ordem eventualmente deteriora e retorna à desordem. É inevitável. Até se falarmos de novo em termos de física, é a 2a lei da termodinâmica. Todo sistema fechado tende a aumentar a entropia, que é o grau de desordem. É literalmente uma lei da física.

Ordem e progresso é o lema dos positivistas de Auguste Comte, ironicamente ela é pró-ciência, mas derivada da época da Revolução Industrial e realmente se acreditava que o pré-requisito pro progresso seria criar ordem. Obviamente é um pensamento já ultrapassado, assim como o determinismo newtoniano. Mas o que eu quero argumentar é que ordem não leva ao progresso. E alguns poderiam concordar dizendo que caos leva ao progresso. Mas anarquia absoluta também não leva a progresso. Então qual a saída?

Já que falei da física que você aprendeu no colégio, lembra outra coisa que aprendeu naquela época? O que acontece quando você ferve água e ele chega no ponto de ebulição de 100 graus celsius no nível do mar? Ele começa a virar vapor certo? Por outro lado se congelar essa água pra baixo de zero graus celsius, ela muda de líquido pra sólido. São as mudanças de fases de um material. Isso é transição de fase de um sistema em equilíbrio. Não vou tentar explicar termodinâmica, nem sou especialista e é muito fácil fazer metáforas erradas, mas deixa eu só arriscar um pouco. A parte importante é só pra lembrar que existe esse fenômeno de transição de fases de um estado de baixa entropia pra um estado de mais entropia, da ordem do gelo pro caos do vapor e de volta pra líquido.

Eu gostaria de ter um pouco mais de bases pra conseguir explicar Einstein, Podolski, Rosen, condensado Bose-Einstein, transição de fase de não-equilíbrio. Quem for físico assistindo, vejam se conseguem explicar em português nos comentários abaixo. Mas vamos nos contentar só com um conceito. A entre-fase entre uma fase e outra, a fronteira que separa uma fase de outra durante sua transição, que é conhecido como Edge of Chaos ou beira do caos, como foi cunhado nos anos 80 na Teoria do Caos por Norman Packard. Mas é na biologia que esse conceito me chamou mais a atenção, em particular no fenômeno de adaptabilidade de sistemas complexos não-lineares. Eu falei um pouco sobre isso no episódio sobre Organizações, depois assistam.

Eu sei que tá ficando bem meta isso, mas aguentem firme. A observação interessante é que todos sabemos que ao longo de milhões de anos, todos os seres biológicos sofrem mutações e via seleção natural temos a evolução das espécies. Mas interessante como apesar de tantas mutações, apesar da segunda lei da termodinâmica que falei antes, os ecossistemas não decaem em caos. Fala-se em adaptabilidade na beira do caos. E falando em termos mais gerais, beira do caos é usado como metáfora pra descrever outros fenômenos difíceis de explicar em sistemas complexos, como uma sociedade por exemplo. Se tudo tendesse ao caos e aleatoriedade, como explicar que todos nós, conseguimos conviver numa sociedade organizada e estruturada que, apesar de altos e baixos, não regride pra puro caos, mas parece avançar. Devagar e sempre?

Beira do caos é o que temos na transição de fase entre ordem e aleatoriedade ou caos. Não temos nem ordem e nem caos, mas ficamos indo e voltando entre ordem e caos. E se isso tá ficando esquisito, existem pesquisas que argumentam que nosso cérebro, nossa rede neutral, funciona mais ou menos na beira do caos. E em particular no campo de Deep Learning existem pesquisas de aplicação do conceito de beira do caos pra melhorar inteligência artificial. Ainda é um campo aberto e em estudo, mas onde eu quero chegar é que nem ordem e nem caos levam ao progresso, nem à adaptabilidade e evolução, mas sim um estado transitório entre ordem e caos, que é a beira do caos.

E aqui vem uma hipótese minha. Pra mim, beira do caos, é o que todo mundo realmente quer dizer quando falamos em “encontrar balanço”, ou “ser equilibrado”. Quando falamos isso, todo mundo pensa automaticamente em ordem, num sistema estático, fixo. Mas eu acho que isso tá errado. Balanço é justamente balançar entre ordem e caos. Por um lado você entende balanço como ordem, como equilíbrio estático, que significa uma balança com os dois lados sempre imóveis e fixos. Pra mim balanço é beira do caos, pendendo entre ordem e caos de tempos em tempos. É um equilíbrio, só que é dinâmico. Hora é +10 pontos, hora é -10 pontos, na média dá zero, saca. Esse é o “segredo”. E como fazemos isso? Disciplinadamente evoluindo um passo de cada vez num ciclo entre ordem e caos.

Se não ficou claro ainda: todos os ciclos que eu expliquei antes: o PDCA de Deming, o DMAIC de Six Sigma, o Kaizen de Lean, o Sprint de Scrum. Durante um sprint de Scrum exercitamos a ordem: trabalhamos linearmente, uma story de cada vez, ao longo da semana. No final fazemos retrospectiva e no review adicionamos um pouco de caos, uma mudança com objetivo de testar uma nova hipótese de resolver um problema. Iniciamos um novo sprint, ordem de novo. Terminamos com um novo review e adicionamos mais um pouco de caos, que é sair um pouco da ordem anterior. Assim como uma mutação genética esperando uma seleção natural no mundo biológico. Ou como nossos neurônios funcionam pra promever aprendizado.

É por isso que você está constantemente ansioso e inseguro quando está estudando. Você tem um programa pra seguir, aulas pra assistir, trabalhos pra fazer, materiais pra ler, mas não sente que tá evoluindo. E é claro. Provavelmente não está mesmo, só tá fazendo o tempo passar. Quantas vezes você pára e testa o que sabe? Realmente testar. No caso de programação, parar e fazer um programinha simples do zero diferente de tudo que já foi pedido nos exercícios? Fora da zona de conforto, tirando as rodinhas da bicicleta? Você nunca faz isso. E quando tenta, não consegue e desiste rápido. Mesmo quando um professor pára pra dar uma prova, isso não testa nada, no máximo que você é bom de decorar as coisas. Mas decorar coisas não torna ninguém um bom profissional em nada.

O ideal seria que os professores dessem provas surpresa o tempo todo. E que as aulas fossem ajustadas e modificadas depois dessas provas. E as provas não tivessem nada de decoreba e sim de raciocínio lógico, que desse pra deduzir a maioria das respostas só por indução e bom senso. Todo mundo aqui ia odiar isso, e eis o motivo: seria caótico, seria fora de ordem, poderia até parecer injusto. Mas eis a realidade: o mundo real é caótico, fora de ordem e injusto, mas você nunca treinou pra isso. Sua reação instintiva é tentar encontrar ordem onde ela não existe. E aí vocês ficam que nem idiotas perguntando pra influencers o que eles acham que você deveria estudar, que cursos deveria fazer, que livros deveria ler. Não importa. Nada disso importa se você não está preparado pra viver à beira do caos. Abandonar esse conceito que existe uma ordem, e abraçar momentos de caos e incerteza como coisas boas.

Se ainda não ficou claro vou repetir. É impossível prever o futuro. Tentar prever é um exercício em futilidade. Tentar planejar tudo que vamos fazer anos pra frente é inútil. Em vez disso planejamos só o que é possível: uma semana pra frente, um mês pra frente, não muito mais. Agora executamos. Seja estudo, seja trabalho num projeto, seja administração de uma empresa. O importante é parar depois de um período curto de tempo e checar a hipótese. Conseguimos atingir essa pequena meta? O que deu errado? O que dá pra melhorar? Adicionamos um pouco de caos, reformulamos a hipótese, e agora continuamos executando por mais um período de tempo. Paramos de novo. E repetimos esse ciclo, resolvendo um pequeno problema de cada vez, melhorando um pequeno aspecto de cada vez, mas garantindo que não estamos cometendo os mesmos erros, e que a melhoria que fizemos vai se acumular.

Você tem dúvida se vai gostar de um determinado curso de 10 meses? Nunca, jamais, sob hipótese nenhuma, compre os 10 meses adiantado, isso é estupidez, é tentar prever o futuro - que já estabelecemos que é impossível. Pare de insistir no impossível. Pague 1 mês e teste. Se gostar e ver resultados, pague mais um mês. Ah, mas se pagar os 10 meses de uma vez vai ser mais barato. Não, não vai. Porque se você não gostar, vai jogar 10 meses fora. Por outro lado, se pagar só um mês e não gostar, vai jogar fora só esse 1 mês. Mas e se o curso não der opção de pagar só um mês? Isso é sinal que eles não acreditam no que estão vendendo e precisam já te forçar a pagar tudo de uma vez pra não poder desistir. Isso é um sinal claro que você pode descartar essa opção porque sem nem experimentar já sabemos que se trata de uma grande fraude. Tá vendo, é assim que evitamos ser feitos de idiotas.

E isso vale pra tudo. Pegue um projeto longo, como garanto que consigo entregar? Eu não garanto. Sempre use a boa e velha estratégia de Jack o estripador: vá por partes. E sempre se lembre do bom e velho Napoleão: dividir pra conquistar. É daí que nasce o conceito de Minimal Viable Product ou MVP de Lean Startup. Em vez de tentar planejar um sistema gigante que parece que vai levar 2 anos pra uma equipe de 10 pessoas entregar, primeiro escolha 1 funcionalidade, em versão simplificada, que é a mais importante do sistema e que 2 pessoas consigam fazer em 2 meses.

Você vai aprender mais sobre a equipe, sobre o produto, e no final de 2 meses, se não gostar do resultado, só perdeu 2 meses e não 2 anos. E se não ficou claro, todo projeto você define o custo e o tempo primeiro, daí encaixa só o que couber nesse limite. O que não couber, não coube. O errado é definir todo o escopo primeiro e tentar fazer o custo e o tempo encaixar. Isso é impossível e quem faz isso parece um idiota tentando encaixar uma peça redonda num buraco quadrado.

A mesma coisa vale do ponto de vista de um programador como eu ou você. Na dúvida, comece fazendo um protótipo. Um código que talvez você pode jogar fora. Talvez não, um código que certamente vai jogar fora. Programar não é só digitar código que nem um idiota. É jogar fora a maior parte do que digitar. Escreva e jogue fora. Escreva e jogue fora. Acostume-se a jogar fora o que faz. Nem tudo que você faz é especial, a maior parte nunca é. Nunca vai ser especial se guardar tudo.

Você precisa jogar fora e produzir mais. Programe um dia inteiro, qualquer coisa, sem nenhum propósito real. E no final do dia, jogue tudo fora. Quantas vezes ouviu alguém dizer isso? Se nunca ouviu falar isso, você só teve péssimos professores. Jogue, tudo, fora. Respira. Começa tudo de novo. Se você economiza e escreve só o que parece que precisa, só pra uma tarefa em especial, e raramente joga alguma coisa fora, eu tenho certeza que você é medíocre.

Só quando tiver uma versão mínima que se sinta realmente confortável, só aí comece a se comprometer com esse código. Desde o começo você vai cometer erros e, pior, começar a repetir os mesmos erros. Adicione testes unitários. Isso garante que no mínimo o que já foi feito, vai continuar funcionando, mesmo que você continue experimentando adicionando mais coisas. Pare, reflita o que fez, adicione caos, refatore o código, pague parte da dívida técnica, e continue. E repita esse ciclo. É como desenvolvimento de software moderno funciona, e não é à toa.

Tudo que você, ou faz sem pensar e só vai fazendo no caos, ou tudo que planeja demais e segue cegamente um plano sem parar pra revisar, vai dar errado. Você precisa balancear ordem e caos. O que significa que precisa intercalar períodos de ordem com períodos de caos, é isso que significa achar balanço. E não é aleatório. Em todo intervalo você mede e critica a hipótese original. Modifica a hipótese e tenta de novo. Nem só ordem, nem só caos. Dar um passo pra trás pra conseguir dar dois passos pra frente. Isso é o que eu quis dizer no começo com “tentativa e erro”, uma forma cíclica de sistematicamente melhorar um passo de cada vez. Melhoria contínua ou Kaizen. Sempre balanceando na beira do caos.

O que estou tentando fazer vocês refletirem é que provavelmente sua forma de pensar ainda é newtoniana determinista positivista, buscando ordem absoluta, evitando caos o máximo possível, com a promessa de progresso. A razão disso é muito simples: vocês tem medo de errar. E nesse medo acaba acreditando que algum guru ou alguém mais especial que você vai dar o camiho das pedras. O segredo é simples: assuma que vai errar, só garanta que vai errar pouco e errar cedo pra não sair tão caro. Daí é só ajustar e repetir.

A raíz do problema de tudo na sua vida é medo. E é um grande clichê mas ainda bem que você tem medo. Parece que tem gente que não tem medo de nada e sai enfiando a cabeça em tudo, até literalmente rachar a cabeça num poste, ou pior, atropelar alguém. Isso não é coragem, isso é imprudência, ou melhor, pura burrice mesmo. Coragem é dar um passo pra frente, mesmo com medo. Eu falei no video sobre como eu aprendi inglês que o que falta pra maioria dos adultos é voltar a ser criança um pouco. A diferença de porque crianças parecem ter mais facilidade de aprender as coisas que adultos é porque elas não tem medo de serem julgadas, de alguém ridicularizar os resultados ruins que ela vai ter no começo. Elas simplesmente ignoram os comentários dos outros e seguem em frente até conseguir o que querem.

Elas viram adultos quando a prioridade passa a ser imaginar o que essa entidade abstrata e fantasiosa chamada “outros” pode pensar dela. Será que vão achar que sou lento? Será que vão achar que sou incompetente? Será que vão achar que eu não levo jeito. Será que vão achar que sou velho demais pra começar? Esse monte de “será” inútil se torna sua muleta e sua rotina de desculpas pra não fazer nada e você se torna um adulto realmente inútil, absolutamente chato e totalmente desinteressante. Todo dia que você não faz nada porque acha que é tarde demais só garante uma coisa, que amanhã vai ser tarde demais menos um dia.

O que você precisa fazer? Ligar o foda-se pra opinião dos outros. Opinião é lixo, opinião não vale nada, e principalmente, a opinião dos outros não paga minhas contas. Felizmente eu pago minhas próprias contas, não dependo de ninguém e por isso eu tô literalmente cagando e andando pro mundo. Se o mundo resolver criticar o que eu estou fazendo falando que é infantil, ou não combina ou qualquer merda dessas, minha resposta é sempre a mesma: vem pegar minhas bolas pra ver se tá gelado.

Programação é a mesma coisa: você não precisa começar programando nada que seja útil. Só precisa começar a programar qualquer coisa, qualquer lixo, pra perder o medo da janela vazia do editor de textos. Programe qualquer coisa e jogue fora. E se você não consegue imagina o que significa algo inútil, esses dias me lembrei que toda distribuição Linux dá pra instalar um programinha super inútil chamado “cowsay”. Em alguns já vem instalado, mas num Arch linux dá pra instalar com pacman -S cowsay ou num Ubuntu acho que um apt install cowsay também funciona. Daí abre um terminal e digita cowsay seguido de uma mensagem qualquer e olha o que aparece.

Sim, esse programa desenha uma vaca com caracteres ASCII na tela. Só isso. Você já viu um programa mais inútil que isso? E mesmo assim é um programa que todo mundo que usa Linux faz algum tempo sabe que existe. Pode sair perguntando pros seus amigos mais veteranos e todos eles vão saber disso. Esse programa existe faz anos, foi escrito em Perl e eu acho que é um excelente exercício pra um iniciante de qualquer linguagem. Experimente fazer um cowsay em Javascript, ou em C# ou em Go, não importa. E pra que? Pra absolutamente nenhuma razão, só pra fazer. Jogue fora no final, faça de novo em outra linguagem, faça outra imagem diferente da vaca, como do pinguim Tux que é outra opção desse programa. Só faz. Programar não tem que ter outro objetivo além de programar em si mesmo. O código no final não é importante, só saber que você é capaz. No final pode jogar fora esse código.

Aliás, eu fico pasmo e chocado quando vejo gente com medinho de começar a escrever código sem objetivo, sem utilidade, com a mentalidade que se ele não fizer algo que funcione perfeito, nem vale a pena começar a fazer. Mas ao mesmo tempo perde horas vendo TikTok, Instagram, jogando Candy Crush ou LOL ou qualquer outra porcaria desses. O que você produziu depois de ficar 1 hora jogando LOL? Absolutamente nada. Ficou mais rico? Não. Ficou mais inteligente? Não. Avançou sua carreira? Não. Foi uma total e completa perda de tempo. Mas você fez mesmo assim. Encare fazer código da mesma forma. Só faça, sem objetivo. Garanto que vai ser mais útil fazer um cowsay pra jogar fora do que jogar meia hora de Candy Crush.

Aprendizado, gestão, empreendedorismo, qualidade, todas essas palavras subjetivas pra mim se resumem a uma coisa: gerenciamento de risco. Gerenciar risco não significa ter zero risco. Muita gente medrosa acha que o objetivo é zerar os riscos. Zero risco é você nunca sair da sua cama, porque só de se levantar você corre o risco de tropeçar, bater a cabeça e morrer. Todos os dias você aceita diversos riscos. Risco de morrer num acidente de carro. Risco de ser morto num assalto na rua. Risco de um fucking meteoro cair na sua casa. Não existe vida sem risco. Se você tentar só minimizar risco, é a mesma coisa que não viver. Morre de uma vez então. Em vez disso assuma que o risco vai existir e você vai avançar de forma prudente, só isso.

Pra finalizar esse motivacional, relembrei de um video motivacional que eu mostrava em palestras que eu fazia lá por 2010 e 2011. É super clichê. Mas nem por isso é menos verdade.

(life == risk)

De novo, nada disso significa ser imprudente. Significa ter coragem. Pra ter coragem você não precisa quebrar leis nem migrar pra esportes radicais. Significa a coragem de simplesmente fazer uma página de código inútil que vai jogar fora no final. Significa testar uma idéia num projeto, num ambiente controlado, e assumir que se não der certo, tudo bem porque o experimento no mínimo vai te informar que aquela direção não ia dar certo. Saia da ordem tempo suficiente pra testar um caos controlado, aprender algo com isso, e reajustar pra uma direção melhor.

Em vez de tentar prever o futuro e errar completamente, você vai ajustando a direção um pedaço de cada vez até chegar no objetivo que queria, com menos desperdício do que se tivesse tentado planejar tudo em detalhes desde o começo. Tentar planejar todos os passos antes de começar a achar que vai conseguir adivinhar todos os passos até o fim é o maior desperdício de todos. Em gerenciamento de risco a máxima é que se sentar ter zero riscos vai acabar tendo 100% de perda. Gerenciar riscos é que nem um seguro de carros. Todo ano você paga e parece um desperdício porque nunca tem um acidente. Imprudência é decidir que isso é um desperdício e cancelar o seguro. É quando você vai ter um acidente feio e não vai ter dinheiro pra cobrir o prejuízo. Isso sim é um desperdício de verdade. Aceite um prejuízo pequeno pagando o seguro. Economia porca não é a mesma coisa que não desperdiçar.

Isso tudo dito, agora eu quero que vocês pensem em outra coisa. Tudo isso que eu falei aqui, eu não li num post de blog essa semana e vim repetir pra vocês. Quem acompanha meu blog desde pelo menos 2008 já leu algumas dessas coisas. Eu sempre tive as mesmas dúvidas que todos vocês. Será que eu estou estudando do jeito certo? Será que estou gerenciando projetos da melhor forma? Será que administro empresa do jeito certo? E se não ficou claro, todas essas perguntas sempre são a mesma coisa. Administrar uma empresa, gerenciar um projeto ou aprender algo novo, tem os mesmos princípios. Você é uma empresa de uma pessoa só, sua carreira é um projeto, e tudo é um aprendizado. Não são assuntos distintos.

Como você vai aprender se não sabe o que significa aprendizado? Como vai entregar um projeto se não sabe definir o que é gerenciar? Como quer empreender se sequer sabe definir o que significa a palavra empreender? A maioria de vocês tem um entendimento superficial dessas palavras e os diversos posts de Linkedin, palestras de gurus e videos de influencers, cada um vai vomitando definições erradas, sem dar fontes, dizendo só o suficiente pra você comprar os cursos deles. Fazendo frases bonitas de efeito com tom afirmativo e confiante. É tática de vendedor e você cai que nem um pato, porque tem preguiça de pesquisar.

Ao mesmo tempo que sempre teve um monte de coisas de programação e tecnologia que eu queria aprender e nunca parei de estudar, eu me cansei de não ter certeza e em paralelo gastei uma década estudando todas as coisas que mencionei neste video e muito mais. Essas coisas não se ensina na escola. Quem é de engenharia de produção deve ter reconhecido quando falei sobre coisas como Lean e Six Sigma. Quem é de física e biologia reconheceu quando falei de transição de fases e adaptabilidade. Quem é de economia já deve ter ouvido conceitos similares também.

Parte da sua carreira, se quiser evoluir pra uma etapa superior, é sair da sua própria área e investigar um pouco da área dos outros, em particular das ciências de verdade. Vai notar que muitos assuntos que discutimos em engenharia de software como se fosse uma grande novidade na verdade já existe em economia, física, biologia, outras engenharias, faz décadas. Pare de ler posts motivacionais de LinkedIn, que contribuem zero pra sua carreira, e busque a literatura original. Eu sempre falo que os livros que realmente compensam ler precisam passar pelo teste do tempo, e a maioria é do século passado. No meu caso, eu tive a sorte de esbarrar em alguns deles lá atrás, nos anos 90 e começo dos anos 2000. E já adianto que de lá pra cá não teve tanta novidade não, só os mesmos assuntos que ganharam outros nomes e por isso parece que tem tanta coisa nova. De novo, técnica de venda, marketing, e você continua caindo. Os últimos 10 anos foram muito tediosos nesse sentido.

Em resumo, por mais estranho que os conceitos apresentados pareçam, é basicamente assim que todo ecossistema da natureza funciona. Sem um sistema centralizado de autoridade. Sem um planejamento centralizado. Sem uma ordem definitiva que todos os animais e seres vivos sigam. À primeira vista parece um sistema fechado que vai deteriorar com o tempo, aumentar a entropia, como na segunda lei da termodinâmica. Mas em vez disso sabemos que não só esse sistema não deteriorou como evoluiu, desde microorganismos nos oceanos milhões de anos atrás, até a diversidade de espécies que temos hoje. Esse é o resultado de um sistema de beira do caos.

Mais importante, descentralização, livre competição, adaptação, são características de um sistema natural. Autoridade centralizada, planejamento ordenado, são características de um sistema artificial que sempre deteriora. É inevitável. Portanto tirem da cabeça que qualquer sistema assim possa jamais funcionar, seja sistema educacional, sistema empresarial, sistema econômico ou sistema político. Mesmo que por um curto período de tempo parece que funciona, eventualmente começa a deteriorar.

Enfim, como disse no começo, a intenção desse episódio foi só apresentar as fontes de onde tirei meu modelo mental de como fazer as coisas. A idéia não é vender nada e nem dizer que essa é a única maneira de pensar. Só uma introdução pra desmistificar o que alguns gurus possam estar tentando te vender de forma incompleta como se fosse grande novidade. Eu tenho um pensamento quase obcessivo nessa idéia de beira do caos e melhoria contínua. Toda vez que estou fazendo a mesma coisa do mesmo jeito por muito tempo, eu preciso chacoalhar e fazer alguma coisa diferente.

E pra quem chegou faz pouco tempo no canal. Eu venho contando aspectos disso em diversos videos, em particular na playlist de carreira, onde falo sobre faculdade, mercado, carreira e como encarar os desafios de se comprometer, assumir suas responsabilidades e parar de terceirizar suas decisões pra um influencer bosta qualquer. O medo é sempre o mesmo: e se eu errar. Ué, se errar errou. Levanta, e faz de novo, diferente, pra não errar a mesma coisa. Louco é aquele que fazendo sempre a mesma coisa, espera ter resultados diferentes. Se ficaram com dúvidas mandem nos comentários abaixo, se curtiram o video deixem um joinha, assinem o canal e não deixem de compartilhar o video com seus amigos. A gente se vê, até mais.

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