[Akitando] #102 - Entendendo Sistemas de Arquivos: FAT

2021 July 20, 11:37 h

DESCRIÇÃO

Como seus programas sabem onde encontrar arquivos no HD? Como diretórios e arquivos são organizados?

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Olá pessoal Fabio Akita

Depois dos últimos episódios espero que vocês tenham entendido mais sobre como HDs são organizados em partições e volumes e como seu computador boota e acha o sistema operacional instalado no HD. Hoje quero explicar o que tem dentro dos volumes do HD: os sistemas de arquivo ou filesystems.

Vou começar contando um pouco o que me lembro. De como a vida era difícil nos PC dos anos 80 e 90 com o maldito filesystem FAT, que corrompia fácil. Apesar de muita gente não gostar, o NTFS do Windows NT foi um adianto de vida enorme. No Linux a gente tinha a série ext de filesystems. Nos Macs tinha HFS. Mas qual a diferença?

(...)

Antes de começar o assunto eu queria voltar de novo alguns episódios pra trás. Vocês já devem ter notado que fico insistindo nos videos de introdução a computação com videogames e mencionar cartuchos. Quando falei de cartuchos pela primeira vez foi só pra chegar nessa introdução de hoje.

Vocês lembram que nos chips da ROM a gente guarda as instruções do jogo em si mas numa região especial tem todos os assets do jogo, as imagens ou tiles, que formam os sprites dos personagens, por exemplo. O intervalo de endereços que definem a área CHR, que provavelmente quer dizer characters. Sem mappers só tem um intervalo pequeno de 8 kilobytes do endereço 0000 até 1FFF.

Sprites, como do Super Mario, são formados por tiles ou azulejos. Quatro tiles formam o Super Mario. Cada tile com 8 por 8 pixels. Então o Mario inteiro são 16 por 16 pixels. Vamos fazer umas continhas de padeiro. Sem nenhum mapper, pode ter no máximo 8 kilobytes ou 8 mil cento e noventa e dois bytes. Acabei de falar que cada tile tem 8 por 8 pixels. No Super Mario conseguiram entuchar quinhentos e doze tiles.

Portanto, cada pixel só pode ser representado por 2 bits de cor. E pra um NES é mais que suficiente. Hoje em dia, numa imagem normal, se representa cada pixel com pelo menos 24-bits, 8-bits pra cada cor. Se você já mexeu com HTML e CSS, já deve ter escrito uma cor em 24-bits.

Por exemplo FFFFFF é branco. O primeiro FF é o hexadecimal de 256, e representa vermelho. O segundo FF é pra verde e o terceiro é pra azul. Os três no valor máximo de 8-bits que é FFFFFF, vai dar branco. FF0000 significa vermelho no máximo e zero pra verde e azul.

Hoje em dia tem bem mais cores que isso, em vez de 24-bits podemos usar 30 bits, onde cada uma das 3 cores básicas pode ser representada com 10-bits. Por isso, quando você vê um monitor ou TV moderna dizendo HDR-10 é High Dynamic Range com cores de 10-bits. Mas cores é assunto pra outro dia. O problema é o seguinte: se um tile de nintendinho fosse representado com esse tanto de cor, 30-bits, um tile de 8 por 8 pixels seria 8 vezes 8 vezes 30, ou seja mil noventos e vinte bits. Divide por 8 pra ter em bytes e isso seria duzentos e quarenta bytes.

Só que aí, nos nossos pobres 8 kilobytes de ROM no cartucho, só caberia trinta e quatro tiles. Pra fazer caber quinhentos e doze, o máximo que podemos usar pra cores são 2 bits, meio byte. E por isso em videogame antigo tinha uma outra estrutura de dados que são as paletas de cores. Note no debugger do emulador Mesen que embaixo do zoom do tile tem uma estrutura de 4 cores, essa é a paleta atual.

A gente pode mudar a paleta e as cores dos tiles vão mudando. É assim que se consegue reusar os tiles que formam a nuvem e tem cores como azul e branco e pra fazer o arbusto, basta trocar a paleta pra verde. Olhem aqui no nosso debuger como esse tile tá verde, mas quando aparece a nuvem na tela, muda pra branco. É o mesmo tile, só muda a paleta.

Sem detalhar porque, o nintendinho tinha uma paleta total de 54 cores mas cada tile só podia escolher entre uma paleta que tem no máximo 3 cores, mais o preto, então 4 cores, representado por 2-bits. Isso faz cada tile de 8 por 8 pixels ocupar 32 bytes e num cartucho simples, sem mapper, do endereço 0000 até 1FFF, cabe no máximo quinhentos e doze tiles.

Se a gente fosse fazer esse joguinho do super mario num computador moderno, como você faria? Um jeito ingênuo, já que não usamos mais cartuchos, seria gravar cada tile em um arquivo, tipo tile1.png, tile2.png, etc. Cada arquivo contendo exatamente os 32 bytes de cada tile. A parte divertida é que o arquivo na verdade vai consumir mais que 16 bytes. Por que?

Porque só o nome do arquivo "tile1.png" tem 18 bytes (em double byte, letras em UNICODE, lembra?). Só o nome já aumenta quase 50% o tanto de bytes. E não acaba aí. Em qualquer gerenciador de arquivos você consegue ver coisas como a data de modificação do arquivo. Precisa guardar esses bits, e digamos que ocupe 1 byte ou mais. E tem que guardar em que diretório esse arquivo tá, então no mínimo mais um ponteiro de endereço pra estrutura de diretório.

E na realidade tem mais metadados que isso, então cada arquivinho de 32 bytes vai ter quase o triplo de bytes pros metadados. Num Linux, na realidade, é mais que isso. Cada arquivo tem 2 kilobytes de metadados e estruturas. Os metadados são maiores que esse conteúdo. Por isso que você não deveria tentar guardar uma coisa tão pequena num arquivo. Claro que ninguém faz isso, mas só pra explicar caso você nunca tenha pensado nisso: metadados custam bytes e não são poucos. O tamanho de um arquivo não é só o tamanho do conteúdo.

Se o cartucho de Nintendo usasse um sistema de arquivos como um ext4 de Linux moderno, a gente não ia conseguir colocar quase nenhum tile nele. Só de metadados inúteis já ia encher. Aliás, a configuração do ext4 não ia caber no cartucho. E por isso que um cartucho não usa sistema de arquivo. Nenhum tile tem nome nem nada, só direto o endereço. Sistema de arquivos substitui a necessidade de lidar com endereços, ao custo de adicionar peso pra dar nome e organização pras coisas.

Se eu fosse simular um cartucho numa linguagem moderna, os bytes de tiles, guardaria num array. E se fosse gravar num dispositivo, gravaria todos os bytes crús juntos num arquivão só. Aliás, é isso que é uma imagem de ROM de cartucho que você roda num emulador: todos os bytes crus do cartucho. Mas aí, como você ia carregar só o tile correto? Igual se fazia antigamente: indo na posição desse arrayzão onde começa o tile e mandando ler só 32 bytes.

Quando a gente espeta um cartucho num videogame ou num microcomputador antigo como um Commodore, é o equivalente a espetar mais memória já pré-carregada. Quando executa um jogo num PC que tá gravado num disquete ou mesmo HD, primeiro ele carrega o jogo na memória, então tem um passo a mais e gasta a RAM. Sistema de arquivos aparece quando a gente passa a ter um dispositivo de armazenamento, de onde vamos carregar dados pra memória pra depois usar. Não usamos os bytes direto do dispositivo porque é lento demais.

É a transição da fase que computador só tinha memória e expandia com cartuchos. Daí passamos a usar gravador de fita cassette pra guardar os bytes do programa, literalmente uma fita de bytes. Um Commodore 64 usava um sistema de arquivos bem rudimentar, basicamente uma lista ligada com a coordenada de trilha e setor, 2 bytes pro próximo bloco e duzentos e cinquenta e quatro bytes de dados. Acho que era uma tabela de nomes de arquivos e cada arquivo sendo uma lista ligada assim.

O problema é que só dava pra escrever sequencialmente, e o próximo arquivo começava a partir do último endereço do último arquivo mais um byte e seguia assim. Se apagasse um arquivo, aquele espaço no meio não dava pra ser reusado automaticamente sem usar um comando como MOVE pra literalmente mover os arquivos que tavam depois pra ocupar os bytes antes.

Quando pensamos em dados, seja um único arquivo ou vários arquivos, na nossa cabeça a gente pensa como num cartucho: tudo empacotado um atrás do outro bonitinho. E no fim dos anos 70, no mundo doméstico, muitos computadores eram usados assim: você plugava um cartucho de jogo, jogava e desligava a máquina. Fazia uma conta de calculadora, e desligava a máquina.

Carregava um jogo de uma fita cassette, jogava, e desligava a máquina. E toda vez que desligava, tudo que tava na memória RAM apagava e era isso aí. Videogames até a era de um super nintendo, não gravavam nada em lugar nenhum. Com exceção de cartuchos que dava pra salvar o progresso do jogo, que era basicamente um chip de RAM ligado numa bateria daquelas de relógio dentro do cartucho.

Sistema de arquivos era mais comum num computador comercial, um mainframe ou minicomputador, rodando UNIX, gravando as coisas em rolos de fita gigantes ou nos primeiros HDs, que também eram gigantes, suportavam só alguns kilobytes e custavam uma fortuna. Mas foi só no começo dos anos 80 que coisas como disquetes e fitas cassete começaram a aparecer.

Daí surgiram os primeiros programas de produtividade, como eu já tinha mencionado em outros episódios, editores de texto como Wordstar ou Wordperfect, planilhas como Lotus 1-2-3 ou Visicalc, bancos de dados como dBase. Você ficou o dia todo criando uma planilha de custos, precisava gravar esses dados em algum lugar. Não podia ser como antes que ia desligar a máquina, perder tudo e ter que redigitar tudo no dia seguinte. Daí surge a necessidade de sistemas de arquivos que começaram bem rudimentar em micros como MSX ou Commodore.

Nos anos 80, cada microcomputador como Apple II, Commodore e tudo mais usava um sistema de arquivos proprietário. Trocar arquivos entre micros era um saco. Além do sistema de arquivos, no caso de arquivos texto, nem todo mundo usava ASCII, então mesmo conseguindo copiar pra outra máquina, quando abrisse pra editar vinha caracteres estranhos porque cada um usava códigos diferentes pra símbolos diferentes.

Com a dominância dos clones de IBM PC e todo mundo rodando ou MS-DOS ou um clone de MS-DOS, meio que estabilizou que o sistema de arquivos mais comum seria FAT e a tabela de caracteres seria ASCII ou uma variante. FAT é sigla pra tabela de alocação de arquivos. Assim como expliquei sobre MBR ou GPT dois episódios atrás, FAT é uma estrutura de dados que define como que arquivos e diretórios são gravados e organizados. O MBR ocupa o primeiro setor da primeira trilha do primeiro cilindro, logo na sequência os próximos setores vão guardar a FAT.

Naquela época a maioria das pessoas não tinha HDs, no máximo floppy ou disquetes. Acho que os primeiros tipos, que gravava só de um lado não era mais que 160 kilobytes no total. A gente grava informações sobre o disco e a tabela de arquivos, ou mais corretamente, tabela de alocação de arquivos que é File Allocation Table ou FAT, nos primeiros setores da primeira trilha do disco, lembra? Se as estruturas de dados pra guardar esses dados fosse muito grande, ia usar parte significativa desses 160 kilobytes.

Pra ter uma imagem na cabeça pense no seu disco sendo um linguição de bytes, que a gente pode desenhar como sendo várias linhas uma embaixo da outra. Você já sabe que HDs lêem bytes em blocos. O HD reconhece setores e vai lendo de 512 em 512 bytes. O primeiro setor do disco, lá no endereço 0 é o master boot record, que é uma estrutura de dados que vai configurar as partições. Sendo 512 bytes vai do endereço 0 até 01FF.

Existem várias versões de MBR, que foi evoluindo até ser substituido por GPT como você já sabe. Mas na primeira versão, a partir do endereço 01BE tinha entradas de partição, que é outra estrutura de 16 bytes. No MBR original eram 4 espaços de 16 bytes reservados pras 4 partições possíveis. Era só isso até criarem o conceito de partições extendidas, mas nem vou perder tempo detalhando porque hoje a gente usa GPT, que permite muito mais partições, mas também ocupa mais que um setor no começo do disco.

Independente se é MBR ou GPT, só entender que o primeiro setor do disco é reservado pra ter esse índice. E cada entrada de partição que você configurar com um fdisk da vida vai ter a coordenada em CHS no caso de MBR ou LBA no caso de GPT. Enfim, o endereço onde começa e outro endereço pra dizer onde termina. Daí a BIOS ou UEFI, depois de achar a primeira partição, vai continuar o bootstrapping, carregando o bootloader do sistema operacional, que finalmente vai carregar a kernel, drivers e terminar de bootar a máquina.

Agora você entende quando a gente abre um aplicativo como o Disk Management do Windows e vê essas partições. Elas ficam gravadas nessa área de GPT, e olha só como tem uma partição de 184 mega que é o EFI System Partition, que é pra onde a UEFI vai apontar no boot pra carregar a kernel do Windows. Tem outras partições maiores, de quase 500 mega, que provavelmente é a partição de recuperação. Quando você tá com problemas no boot, vai ter um sistema de emergência pra diagnosticar. Hoje que temos espaço sobrando, deixar reservado meio giga ou um giga, não é uma perda grande se for facilitar nossa vida caso algo dê pau.

Hoje é comum ter pelo menos 128 giga num HD barato. Mas no começo dos anos 80 o comum era no máximo ter 40 kilobytes num cartucho ou 160 kilobytes num disquete. A gente não tinha espaço pra ficar perdendo. Então imagine que os primeiros sistemas de arquivo tinham que ser super simples. Daria pra fazer vários episódios falando de cada um mas vou resumir.

O mais comum no começo foi o FAT12, que tinha endereços de 12 bits. Diferente do que fizemos com memória onde cada endereço aponta pra um byte na memória, endereços de HDs apontam pra clusters. Neste ponto vocês já devem estar começando a se acostumar com o conceito de uma estrutura de dados, tipo uma struct de C mesmo, onde cada campo tem um tamanho fixo em bytes. Sabendo o tamanho de cada campo podemos ir achando os campos no linguição de bytes. Foi assim quando expliquei sobre arquivos executáveis como ELF de Linux, ou o próprio MBR que é tipo uma estrutura de cabeçalho que define o drive.

Do byte 0 até 2 vai ter uma instrução de JUMP de assembly pra um endereço. O bytecode dessa instrução e o endereço vai depender da versão do MS-DOS ou Windows NT, mas é aqui que a BIOS passa o controle pro sistema operacional. Nos bytes seguintes vai ter outras informações como o nome do fabricante, daí vem as informações do layout do drive.

Nos bytes 11 e 12 tem o número de bytes por setor, que costuma ser 512 mas pode ir até 4 kilobytes que é 4096. No byte 13 tem o número de setores por cluster. Eu falei que o sistema de arquivos vai lidar com clusters e clusters pode ser um ou mais setores. É aqui que vai definir isso. Podemos colocar quanto de espaço queremos ter no drive.

Aqui que vem o 12-bits no FAT12. A tabela FAT12 consegue indexar até 2 elevado a 12 endereços pra clusters. Até 4 mil e noventa e seis clusters. Se o cluster tiver 2 setores de 512 bytes cada, o tamanho máximo que dá pra ter na partição vai ser 4 mil e noventa e seis vezes 2 setores, vezes 512 bytes, ou 4 megabytes. O que seria muito pouco. Mas se aumentar o tamanho dos setores de 512 bytes pra 4 kilobytes, esse valor aumenta pra até 16 megabytes.

Qual o problema de fazer isso? Lembra que expliquei no episódio de HDs que um arquivo vai ser gravado um setor de cada vez. Na realidade, vai ser gravado cluster a cluster porque é isso que o FAT reconhece. Então se cada cluster tiver 2 setores e cada setor tiver 4 kilobytes, se pegarmos um arquivo de 40 kilobytes pra gravar, precisamos reservar 2 clusters inteiros na FAT pros primeiros 32 kilobytes. Mas os 8 kilobytes restantes vai ocupar o próximo cluster inteiro. Ou seja, vai desperdiçar espaço no fim desse cluster. O arquivo de 40 kilobytes na realidade vai ocupar 48 kilobytes reais no disco. É um desperdício de 20% do disco.

Se você escolher um setor de 512 bytes como antes, cada cluster só vai ter 1 kilobyte. Mas o FAT só consegue indexar os mesmos 12-bits, 4 mil e noventa e seis clusters. Aí só dá pra ter uma partição de 4 megabytes em vez de 16. Naquela época isso não era ruim, porque a gente lidava mais com disquetes. No começo dos anos 80 o mais comum acho que era o disquete de 5 e 1/4 polegadas de 360 kilobytes. Então setores de 512 bytes tava de boa.

O problema foi do meio pro fim dos anos 80, quando passamos a ter HDs ou winchesters. Em 1990 eu tinha um winchester de 10 megabytes. Agora o FAT12 sozinho não ia dar conta. Por isso foi atualizado pra FAT16. Agora a tabela podia ter 2 elevado a 16, mais de 65 mil clusters. Se manter 2 setores por clusters e setores de 512 bytes mesmo, ainda assim já daria pra ter uma partição de até 64 megabytes. Então tava seguro. Até o meio dos anos 90 pouca gente tinha um HD tão grande assim.

Se você não tá acostumado com megabytes. Seu HD no seu computador aí deve ser de 128 giga ou mais. Se for um computador bem barato talvez seja de 64 gigas. Espero que não, porque o diretório C:\Windows sozinho deve estar ocupando mais de 20 gigas. 1 giga é mil e vinte quatro vezes 1 mega. Ou seja, um HD de 64 giga é mil vezes maior que um HD de quase 30 anos atrás.

Mas aí, no meio dos anos 90, chegou a hora de aparecer o Windows 95, que ia tentar tirar o atraso nas interfaces gráficas que sistemas como Amiga e Mac já tinham faz anos. Mas construir uma interface gráfica em cima do FAT16 tinha um grande problema: a estrutura de dados que se chama "directory entry" era gravado assim no disco:

Os primeiros 11 bytes era o nome do arquivo de 8 bytes e uma extensão de 3 bytes. Só quem usou micros antes de 95 lembra disso. Era horroroso ficar criando vários documentos, planilhas, código fonte de programa e estar limitado a nomear arquivos só com 8 letras. A gente tinha que ser criativo. Mas era assim porque espaço de memória ou disco até aquele ponto custava muito caro. Lembra que eu falei que nome de arquivo ocupa espaço?

Eu lembro quando programava Clipper que a gente seguia essa convenção no nome dos campos em tabela de banco de dados. Era muito comum ter campos como CODCLI pra código de cliente, ou NOMCLI pra nome de cliente, DATVAL pra data de validade e assim por diante. Aliás, era pra economizar memória que datas eram gravadas no formato YYMMDD que é dois digitos pra dia, pra mês e pra ano, considerando que se YY fosse 80 então era 1980.

De qualquer forma, precisava resolver isso. Nessa entrada de diretório, que usava pra diretório e pra arquivo, o byte 11 depois da extensão era um vetor de bits. Outro dia vou falar das vantagens de um bitvector e bitmasks, mas deixa eu resumir.

Um byte tem 8 bits. Você pode pensar em cada bit como se fosse um interruptor de luz. 1 é ligado e 0 é desligado. E o campo inicializa com tudo zerado. No caso do FAT, se eu ligar o 1o bit, o bit 0, significa que é um arquivo ou diretório só de leitura. Se ligar o bit 1, é um arquivo ou diretório escondido. No caso de um Linux, ser escondido é ter o primeiro byte do nome sendo um ponto, os dotfiles. Mas no FAT é só 1 bit, então pra indicar se um arquivo é escondido em FAT usamos 7 bits a menos que no Linux.

Continuando, se ligar o bit 2 vai indicar que é um arquivo especial do sistema. Se ligar o bit 3 é a etiqueta ou nome do volume. Se ligar o bit 4 finalmente indica que essa estrutura tá definindo um subdiretório. Por outro, lado se ligar o bit 5 é um arquivo. Imagino que os bits 4 e 5, só um deles pode ser 1 e o outro 0. Já os bits 6 e 7 não significam nada e são ignorados.

Ou seja, em um único byte a gente conseguiu enfiar 6 informações diferentes. Se você fizesse do jeito ingênuo como uma struct com 6 campos int, ia gastar 6 bytes inteiros, 5 bytes a mais do que usando um único campo de 1 byte. Isso é muito comum pra guardar informações que é só verdadeiro ou falso, 1 ou 0. Você só precisa de 1 bit pra representar essa informação. Essa técnica aumenta a densidade de informações por byte.

E eu me dei ao trabalho de explicar isso porque a forma de permitir nomes longos a partir do Windows 95, foi atualizar o FAT16 pra VFAT. E a principal diferença é que toda vez que cria um arquivo vai criar duas entradas de diretório. Um igualzinho o que acabei de explicar, começando com 11 bytes pro nome no formato antigo de 8 letras e extensão de 3 letras. Mas a segunda estrutura ia entuchar mais bytes no meio pra caracteres, agora em formato UNICODE em vez de ASCII, já que a ambição do Windows 95 era expandir pelo mundo em diversas línguas.

Pra programas de DOS antigos não se confundirem, ainda ia ter a estrutura antiga, que ia ignorar a estrutura nova. Pensa que na mesma lista você tem as duas estruturas. Mas aí o DOS antigo ia ler o byte 11 que é o bitvector de atributos e encontrar 0xF, tudo ligado 11111111, que é um atributo inválido, então um DOS antigo ia ignorar.

Na prática, você podia digitar um documento no Word do Windows 95 e salvar como hoje, com um nome como "Escopo do Projeto Secreto.doc". Vai gerar uma entrada de diretório com caracteres UNICODE normalmente e junto gerar uma segunda entrada com uma versão no formato antigo de 11 bytes. Provavelmente vai ser "ESCOPO~1.DOC". Se gravar outro arquivo como "Escopo do Projeto do Ano que vem.doc", vai gerar uma versão de DOS chamado "ESCOPO~2.DOC".

Esse esquema dura até hoje no NTFS do Windows 10. Se não acredita abre um command prompt e digita "cd c:\progra~1" e ele cai no "Program Files". Se abrir o Explorer do Windows e digitar "C:\progra~1", ele vai te mandar certinho pro diretório "Program Files". O DNA do DOS ainda existe.

O VFAT foi uma versão feita pro lançamento do Windows 95, mas logo no segundo DLC que foi o Windows 95 OSR2, a versão que funcionava de verdade, o VFAT foi substituído pelo FAT32. Você já imagina que a tabela subiu pra endereçar 2 elevado a 32 cluster em vez de 16, até 4 milhões de clusters. Com setores de 512 bytes isso daria uma partição de tamanho máximo teórico de 4 terabytes.

Se o cluster só tiver 1 setor, então ia até 8 terabytes, mas cada arquivo dentro só poderia ter 4 gigabytes. É 32-bits, então só dá pra ler e gravar 2 elevado a 32 bytes de dados crús, o que dá o famoso limite de 4 giga por arquivo. Mas a gente já viu no outro episódio que era a BIOS e o MBR que não permitiam ter partições maiores que 2 terabytes. Finalmente o FAT32 seria o filesystem que ia durar a virada do século.

Em paralelo a isso a Microsoft tentou muitas coisas dos anos 80 até começo dos 90 pra abrir mais pro mercado de workstations, onde tava a Silicon Graphics ou a Sun. Mas MS-DOS e Windows 3 não era suficiente. Por isso teve as iniciativas como o XENIX que foi um UNIX da Microsoft que não vingou e a parceria com a IBM que deu origem ao OS/2. Tem muito sistema como máquinas antigas de sacar dinheiro, as ATMs, sistema de bilhete de metrô e coisas assim que ainda rodam em OS/2.

Um dia eu tento falar do OS/2 mas ele era mais sofisticado que o Windows 95, que não era muito mais que um sistema parasita que espera o MS-DOS bootar em modo real pra depois ligar o modo protegido e dar controle pro Windows. Era uma gambiarra de coisas antigas de 16-bits misturado com coisas novas de 32-bits. A série do Windows 95, 98 até o famigerado Millenium Edition no final dos anos 90 foi uma bela de uma zona.

Já o OS/2 foi projetado pra ser um sistema mais completo de 32-bits. Acho que a primeira versão era 16-bits mas mudaram rápido. Eu cheguei a ver as primeiras versões do OS/2 que tinha a cara do Windows 3.1. O OS/2 mais famoso acho que o foi a versão 3 Warp e a que perdura até hoje em muitos lugares é a versão 4. E existe uma versão open source que foi feita via engenharia reversa, porque a IBM nunca abriu o código fonte do OS/2.

É quase impossível rodar um MS-DOS ou OS/2 dos anos 90 em máquinas modernas sem modificação. Pra começar, o processo de boot mudou de BIOS e MBR pra UEFI e GPT além disso o hardware de hoje tem mais integrações como ACPI e AHCI que é o Advanced Configuration and Power Interface e Advanced Host Controller Interface. O primeiro pra facilitar o sistema operacional encontrar hardware, configurar e gerenciar energia e a segunda pra falar com os controladores de SATA que fala com drives.

Seu HD provavelmente é SATA e não mais IDE ou SCSI. Sem entender AHCI, a gente nem encontra o HD. Quando você configura uma máquina virtual num VMWare ou Virtualbox da vida, vai notar que eles configuram um HD SCSI e não SATA. SCSI era a melhor interface da época, usado em workstations e Macs. PCs mais baratos usavam IDE mesmo.

Antigamente a gente tinha porta serial, porta paralela e barramento IDE que falava ATA. Ligava impressora na porta paralela, modem na serial. Era um saco configurar alguma coisa nessas portas e barramentos antigos. Ainda não tinha protocolos pros dispositivos se identificarem automaticamente pro sistema operacional. Pensa que isso exige mais bytes e um protocolo mais gordo e a velocidade de transferência era bem lenta.

Hoje em dia a gente tem conectores USB como Type C em vez do antigo SCSI, protocolos como USB 3.2 Gen 2 ou Thunderbolt 3 em vez do antigo ATA. Aliás, depois do ATA veio o Serial ATA ou SATA. E esses conectores se ligam em barramentos internos que falam direto com a CPU como PCI Express ou PCIe, que substituiu o antigo PCI e AGP. Essa é uma parte da história que tenho zero saudades: o tanto de problema que era conectar e configurar dispositivo. Nunca funcionava de primeira. Muito diferente de conectar um HD externo num Thunderbolt hoje, que é plug and play de verdade.

Mas vamos deixar dispositivos de lado por hoje. A parte importante é que da parceria da Microsoft com a IBM, no OS/2, surgiu o sistema de arquivos HPFS ou High Performance File System. E ele serviu de inspiração pra outro filesystem, o New Technology File System ou NTFS do Windows NT.

Em paralelo a essa história de FAT. No mundo dos Macs, tinha o Macintosh com o Macintosh File System, que era um pouco melhor que um FAT12 da vida. Mas com a Apple querendo lançar HDs nos Macintoshs eles evoluíram pra uma nova versão de filesystem chamada Hierarchical File System ou HFS.

Assim como o HPFS da IBM pro OS/2 e diferente do FAT, o HFS seria implementado usando B+Trees. Você já entendeu um pouco sobre estruturas de árvores alguns episódios atrás. E eu expliquei rapidamente sobre Balanced Trees ou B-Trees e derivações como B+Trees e B* Trees. Vocês vão ver que essas estruturas estão por baixo de quase tudo que você usa num computador.

Em resumo, são árvores balanceadas de baixa profundidado onde cada nó tem vários filhos de uma só vez. Além disso os filhos nos galhos internos só tem metadados e chaves, onde ficam os inodes. E só as folhas da árvore, os últimos nós externos lá embaixo, é que apontam pros dados em si. No caso, pra clusters ou blocos.

Tem a vantagem de ter tempo de procura razoavelmente bom, especialmente se comparar com uma mera tabela. E diferente de uma árvore binária, a profundidade vai ser baixa porque cada nó vai ter vários filhos em sequência. E como tem vários filhos por nó, nem toda operação de inserção ou deleção vai precisar promover um rebalanceamento, como eu mostrei que acontece numa árvore como red black trees.

Em discos, a vantagem é que isso ajuda a diminuir a fragmentação e aumenta a performance. Os dados são lidos e escritos em conjuntos grandes de blocos de uma só vez. Provavelmente vai desperdiçar um pouco de espaço. Mas isso é outro trade off, a gente troca um pouco de espaço em disco pra evitar fragmentação e aumentar a performance de leitura e escrita. Provavelmente tirando o antigo FAT, todos os file systems usam B+Trees. Mesmo o HFS da Apple em 1985 já era implementado com B+Tree.

Num Mac você sabe que dá pra abrir as propriedades de um arquivo e atribuir uma cor pra aparecer destacado no Finder. E dá pra selecionar o ícone, copiar, e colar em outro arquivo. Sem ter um arquivo de icone separado. E muito mais, mas você já pensou onde que se armazena essas coisas?

A cor do arquivo até pode ir nos metadados no nó da árvore mas e um ícone que tem múltiplos bytes? Ele vai num resource fork. Na realidade o nó da árvore pode apontar pra dois galhos de dados, um é o data fork que aponta pro primeiro byte do conteúdo do arquivo propriamente dito. O outro galho é o resource fork que aponta pro primeiro byte de um outro conjunto de dados escondido.

Por isso que quando você faz um arquivo zip comprimido num Mac e descompata num PC, vem um diretório estranho chamado "underline" MACOSX. Digamos que você tava compactando um arquivo chamado "retrato.jpg" então nesse diretório estranho vai ter um arquivo "._ retrato.jpg" que são os bytes que ficavam no resource fork.

Como nem todo filesystem tem suporte a resource forks, em particular FAT não tem nada nem perto disso, então o Mac é obrigado a criar arquivos de suporte pra não descartar informações. Se você copia de um Mac pra outro Mac, isso é transparente. Mas se usa um filesystem intermediário, ou um formato de arquivos como Zip, ele é obrigado a dar um jeito. O NTFS tem suporte a forks, que chama de ADS ou alternate data streams.

Se você abrir um command prompt num Windows 10 de hoje, sabe que dá pra criar arquivos texto como num shell de Linux. Basta fazer echo "hello world" > hello.txt e tá criado. Se usar o comando more hello.txt vai listar de volta o conteúdo. Trivial, todo mundo sabe isso. Mas o que muitos de você não sabem é que posso escrever bytes nesse alternate data stream do arquivo. Tente fazer echo "isto é um segredo" > hello.txt:segredo. Pronto. Se usar o comando more de novo, não vai enxergar nada, só o texto original. O que aconteceu?

Agora posso fazer more < hello.txt:segredo e olha só, o texto secreto apareceu! Se abrir num editor de textos normal, nunca vai ver esses bytes. Praticamente ninguém suporta alternate streams nos programas. Mas esse arquivo agora carrega esse segredo escondido. Pena que é um recurso que acaba sendo desperdiçado. Esse 'segredo' é o nome do stream de bytes e a gente pode criar vários streams diferentes.

E é mais chato ainda porque se a gente tentar copiar esse arquivo pra algum pendrive em FAT32 da vida, o Explorer vai avisar que o arquivo tem propriedades que não vão ser copiadas e parar por aí. Daí perdemos aquele segredo porque, diferente do Mac, ele nem tenta criar um arquivo separado. Como as ferramentas que gerenciam arquivos do próprio Windows male male reconhecem esses forks, eles acabam sendo inúteis pra gente.

E por hoje vou pausar essa história porque no próximo episódio vou começar a falar sobre os outros filesystems e a nova geração que usamos hoje em dia e como esse estudo em estruturas de dados foi modificando a forma como pensamos em arquivos. Se ficaram com dúvida mandem nos comentários abaixo, assinem o canal e não deixem de clicar no sininho pra não perder a continuação. Compartilhem o video pra ajudar o canal. A gente se vê, até mais.

tags: fat windows 95 ms-dos os/2 b-tree akitando

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