[Akitando] #53 - 10 Mitos sobre Tech Startups | Parte 2 [Rated R]

2019 July 02, 17:00 h

Nesta segunda e última parte do tema "10 Mitos de Tech Startups" eu vou pegar mais pesado em porque você insiste em ser enganado o tempo todo por fake-celebridades de empreendorismo de palco e o que você realmente deveria estar pensando se seu objetivo é realmente abrir uma empresa ou ajudar o mundo. Dica: não é em eventinho de startup.

E o episódio de hoje é RATED R de novo porque eu acho que vai doer em muito floquinho. Se for frágil, pegue seus sais antes de assistir. Mas assista!

Links:

=== Script

Olá pessoal, Fabio Akita

Caramba eu tô bem contente com a repercussão dos meus últimos vídeos, em particular meu rant em Esqueça Metodologias “Ágeis” onde eu explico como as consultorias e coaches ágeis destruíram a essência do verdadeiro ágil. Até semana passada eu tinha pouco mais de 9 mil inscritos e meus vídeos raramente batem 5 mil views, ficando na média dos 3 mil a 4 mil, que não é ruim, pois quer dizer que pelo menos metade dos inscritos assiste os vídeos.

Esse vídeo até o dia da gravação de hoje - que costuma ser 2 dias antes de eu lançar - já bateu mais de 15 mil views, ele sozinho trouxe mais de 2 mil novos inscritos, e o canal finalmente alcançou os 10 mil inscritos e rapidamente querendo já passar os 11 mil inscritos. Muito obrigado a todos vocês, e eu só posso concluir que vocês gostam mesmo de tretas. Eu sei, eu sei. Se vocês gostaram daquele vídeo este talvez seja mais uma boa munição pra compartilhar com seus algozes.

O episódio de hoje é a segunda parte dos 10 mitos de startups que eu comecei na semana passada. Na primeira parte eu falei dos primeiros 5 mitos e hoje vamos falar dos outros 5 que coincidentemente são os que eu gosto mais. Se ainda não viu a primeira parte, veja o link nas descrições e assista antes de continuar. Vamos lá, eu espero …. Pronto, já assistiu? Então vamos continuar.

(...)

Vamos lá. O mito 6 é outra coisa que você ouve muito falar no mercado de TI e em particular no mercado de startups e empreendedorismo. Acho que é o dilema de todo jovem ansioso, e nem posso dizer que está totalmente errado. Mas alguns motivos são piores do que outros. Você não tem tempo pra perder, então larga a faculdade. E um dos argumentos pra isso é a velha falácia de olhar pras grandes exceções da história como Steve Jobs, Bill Gates ou Mark Zuckerberg, bilionários que largaram suas faculdades. Se na sua cabeça isso parece um bom argumento, pára tudo e vai se tratar.

Vamos começar contando as coisas que você provavelmente não sabe. Um Bill Gates, por exemplo, ele já tinha se associado a Paul Allen e fundado a Microsoft “antes” de largar Harvard. O Zuckerberg já tinha feito primeiro o Facemesh e depois o The Facebook antes de abandonar Harvard. Tirando Steve Jobs, tanto Gates quanto Zuckerberg vem de famílias ricas, eles tinham condições, muitas condições. Porra, eles tavam em Harvard! Não era na faculdade EAD da esquina, era Harvard!

E falando em correlações, na verdade existe uma correlação muito maior e mais significativa entre quem ocupa os melhores e mais influentes cargos dos Estados Unidos, como juízes federais, senadores, CEOs de Fortune 500, os homens e mulheres mais poderosos segundo a Forbes, e a grande maioria deles se formou nas principais universidades de elite dos Estados Unidos, como Harvard. A faixa não formada é quase insignificante nesses gráficos.

Vou falar de networking depois mas o verdadeiro networking começa na faculdade e nos primeiros empregos. Com as pessoas de igual talento ou talento superior ao seu, com os quais você teve a oportunidade de trabalhar lado a lado por longos períodos de tempo. Onde essas pessoas tiveram tempo pra avaliar quem você é de verdade, se é honesto, se realmente entrega o que promete, se é melhor do que os outros ao redor. Principalmente, se você é realmente confiável. Nada disso vem de uma pequena conversa em evento de startup. Essas coisas só surgem de relacionamentos de longo prazo, e o melhor lugar pra começar isso é nas melhores universidades que você puder entrar. Se fosse só o conteúdo você podia só estudar o mesmo currículo que se estuda em Harvard e ser a mesma coisa. Mas não é só isso, você não vai ter esses relacionamentos num EAD. Esse é o real valor de um Harvard.

Como eu já expliquei em vídeos anteriores, o treinamento deliberado faz toda a diferença. Assim como Mozart começou a ser treinado na infância, também foi a mesma coisa com Bill Gates, que vindo de família rica teve acesso a tecnologia e networking desde a infância. A Microsoft não foi a primeira parceria entre Gates e Allen. Como prodígios da computação no Colégio Lakeside, aos 13 anos, eles escreveram um programa de folha de pagamentos para uma empresa chamada Information Sciences Inc. Logo depois, eles tiveram a idéia de melhorar o processo de medir fluxo do tráfego de veículos. No formato existente, um tubo sensível à pressão perfurava uma sequência numa fita de papel sempre que um carro passava, com os resultados depois transcritos para cartões perfurados de computador. Depois de juntar 360 dólares pra um microprocessador, Gates e Allen desenvolveram seu computador “Traf-O-Data” para ler e analisar as fitas de papel. Embora isso funcionasse, eles entenderam que sabiam mais sobre construir esse tipo de máquina do que vender. Allen então aponta essa experiência como uma lição importante sobre o valor de um business model.

Já que mencionei business model, o mito número 7 é pra rebater outra coisa que muito amador ainda acha importante: ficar gastando tempo, dias, semanas, meses desenhando slides bonitos de powerpoint e chamando isso de Business Plan.

Um business model é a descrição do seu negócio, suas capacidades, seus produtos e serviços, seu formato de distribuição, seu modelo de custos, suas parcerias, sua infraestrutura, enfim, tudo que define seu negócio. Um business plan é seu plano de ataque, como você cresce seu business model em um negócio de verdade, seus objetivos, sua missão e seus valores, quem é sua concorrência, sua estratégia financeira, sua estratégia de marketing, sua estratégia de trabalho.

Tudo isso é importante. Mas nada disso você desenha no dia 1 e segue como um passo a passo pelos próximos meses ou anos. Tanto o business model quanto o business plan são temporários, meros rascunhos. Na prática eu diria que se você precisa demais de um business plan, você não sabe o que está fazendo e nem devia estar começando. Especialmente numa pequena empresa, essas coisas não tem quase nenhum valor. O único que consegue desenhar um business plan de verdade, que faz sentido, é quem já lidou com várias empresas antes, daí você basicamente escreve o que você já sabe por experiência. Quem não sabe, não vai descobrir desenhando um plano teórico. O plano só reflete a experiência atual do empreendedor, se for seu primeiro negócio, garantidamente seu business plan é uma droga. Simples assim.

Quem viu meus videos anteriores já sabe: eu já disse que programador é uma profissão de prática, e os primeiros códigos serão uma droga. Isso é normal. Eles ficam melhores com treino deliberado. Empreendedor é a mesma coisa: é uma profissão de prática. Não interessa se você fez MBA ou qualquer coisa desse tipo: seu primeiro business plan vai ser uma droga. Empreender é muito tentativa e erro. Portanto, não importa se você gastou 1 semana ou 1 mês desenhando esse plano, ele não vai ficar melhor só porque você ficou refinando cor de slide e tamanho de fonte mais 1 semana ou 2. E quando eu digo uma droga, não estou dizendo que só vai ter bobagens escritas nos slides.

Pelo contrário: se você se dedicar vai ter muita coisa correta que você vai copiar de diversos livros sobre administração ou coisas assim, só que você nunca praticou nada do que está escrevendo. Pra você vai ser só um monte de jargões, tudo teoria. É como se em vez de um business plan você estivesse escrevendo uma rotina de treinos pra se tornar campeão olímpico. Só que você nunca nem subiu numa esteira sua vida inteira. Você acha que interessa qualquer coisa que você pode escrever numa rotina de treinos teórica? Sério: você nunca fez uma flexão na vida e acha que escrever sobre ser campeão olímpico te deixa um passo mais próximo de ser mesmo? Cai na real.

Muita gente até hoje ainda fica obcecado em fazer business plan porque é isso que muitos livros e palestras de empreendedorismo dizem pra fazer. É isso que muitos programas de incubação e aceleração mandam fazer. É isso que muitos coaches ou mentores mandam fazer. E se for esse o caso, isso é bullshit. Mais bullshit ainda é o objetivo de porque muitos gastam tempo fazendo isso: pra conseguir funding.

Na cabeça idiota de empreendedor wannabe que acredita em conto de fada é que se você fizer o melhor e mais bonito business plan, com o melhor e mais bem treinado sales pitch, que você apresenta impecavelmente em evento de startup na frente de uma banca de VCs e investidores de seed money, então você tem grandes chances de conseguir funding. E com esse funding você finalmente vai conseguir executar sua ideia e criar sua startup.

Tá errado. Tá tudo errado. Vou te dizer como um investidor pensa: se a única coisa que você tem pra mostrar é um punhado de slides de powerpoint, seu valor é zero. Não importa o que tem nos slides. A menos que você me diga que nesses slides tem alguma coisa como o segredo pra curar cancer, qualquer outra coisa, não importa o que seja, é lixo por padrão. Ponto final, é isso que o investidor pensa, não importa o que ele te diga. E ele não está errado!

Pra começar, um investidor precisa ver alguma coisa funcionando. Portanto, faz aí seu business plan, executa aí esse business plan, e com um resultado palpável em mãos, daí vá procurar funding, que talvez você precise pra expandir seu negócio. Mas o negócio precisa existir primeiro. Muita gente quer ganhar funding pra poder largar o emprego e ter uma outra fonte de renda, ou seja, salário, enquanto executa seu business plan. Isso é bullshit. Se nem você acredita em você mesmo o suficiente pra arriscar seu próprio dinheiro e tempo na sua própria ideia, porque você acha que um investidor vai arriscar um real dele ou um segundo do tempo dele em você?

Várias vezes eu já encontrei esses fake empreendedores, são todos sempre um saco. Eles me aparecem com um business plan ou mesmo só um sales pitch e falam que precisam de alguém pra programar, mas obviamente não querem pagar nada. E tem a audácia de me oferecer alguma coisa ridícula como 10% ou menos do negócio. Bullshit. Na minha empresa a gente responde: ok, eu quero 90% do negócio então. Daí o cara fica indignado dizendo que a idéia é dele e tals. E eu digo, foda-se a idéia, ela não vale dick shit até eu ou alguém executar ela pra você. Se eu que vou realmente trabalhar e construir essa idéia toda do zero, gastando meu tempo e dinheiro, e você vai ficar aí coçando o saco enquanto isso - porque é exatamente o que você vai fazer -, então minha parte vale 100%, e eu ainda tô sendo legal de ter deixar com 10%. Lógico, pára e pensa se essa não é a única resposta que faz sentido a menos que eu goste de jogar dinheiro fora?

Mas e as premiações em competição de apresentação de startup? Os cheques de 100 mil reais? Isso se chama entretenimento. 100 mil reais não é nada, nada. Faça as contas. Digamos que você precisa de 3 bons programadores, e digamos que você pague 5 mil reais pra cada um. Por 3 meses, só em programadores, você já gastou metade desse tal prêmio. Em 3 a 6 meses você vai estar no mínimo faturando 100 mil? Porque se não estiver, pra que você ficou feliz de ganhar 100 mil? Quem está jogando o jogo do entretenimento não vai de fato produzir nada com esses 100 mil, só gastar em aumentar sua própria imagem de marketing pra ficar indo de evento em evento até parecer mais do que é, pra atrair investidores de primeira viagem e ficar engordando um porco que nunca existiu.

Esse é o jogo. Por isso eu não participo desse jogo, não tenho saco pra lidar com gente que só quer construir imagem. Ficar se vangloriando porque ganhou prêmio em evento de startup - ou qualquer tipo de prêmio na real - não significa nada a não ser pra quem está mais preocupado em achar gente pra chupar dinheiro do que fazer um negócio realmente lucrativo. E de novo, esse é o jogo, não vejo nenhum problema em quem joga sabendo disso. Mas você que está de fora e por alguma razão acha que tem algum valor pro seu negócio ganhar um prêmio, você está com suas prioridades erradas.

Mas digamos que você acredita de verdade na sua idéia, digamos que você teve a idéia de produzir alguma coisa via impressoras 3D, você acha que as pessoas vão querer. Qual é sua próxima grande idéia? Qual seu business plan? Talvez conseguir funding pra comprar um monte de impressoras 3D pra produzir em maior quantidade. E obviamente isso é uma idéia idiota. Se você quer produzir uma peça em grande quantidade, você não produz você mesmo. Você manda produzir na China. Você transporta de volta pra cá em containers. Você lida com centros de distribuição e logística. Você procura conseguir vantagens fiscais. E como você faz pra saber tudo isso?

Você trabalha! Você trabalha em empresas de varejo, em empresas de produção, em empresas de logística, aprende de verdade como funciona o caminho burocrático, quem são os fornecedores confiáveis, como negociar com estrangeiros, como configurar logística. São anos e anos aprendendo como as coisas de fato funcionam e não como você “acha” que funciona porque assistiu uma palestra do TED Talk.

A grande maioria das tais ideias de startups acabam sendo tudo Uber de qualquer coisa porque vem de pessoas que nunca trabalharam ou trabalharam pouco. E o que uma pessoa que nunca trabalhou conhece? Só os apps que estão instalados no smartphone dele. Ele não tem como melhorar como as empresas funcionam porque ele nunca trabalhou tempo suficiente nem em uma pra saber como as coisas funcionam, o suficiente pra saber como melhorar.

Portanto: se a única coisa que você tem é uma idéia, nem perca tempo fazendo slide de powerpoint. É perda de tempo. Arranje um emprego e vai trabalhar alguns anos na área que você diz que quer revolucionar primeiro. Como alguém tem a audácia de dizer que vai revolucionar a área de saúde e nunca sequer botou os pés num posto de saúde? Consegue ver como isso soa ridículo?

Principalmente: nunca acredite num investidor logo de cara. O objetivo do investidor não é fazer seu sonho se realizar, é em como ganhar dinheiro se isso acontecer. Ninguém aqui está no negócio de caridade e, de novo, isso não está errado. Suas premissas é que estão erradas porque ninguém tem obrigação de dar dinheiro a troco de nada.

E falando em não acreditar, no mito número 8 eu diria pra parar de acreditar em fake celebridades. Seja investidores, seja influencer, ou todo tipo de empreendedor de palco. Isso é uma das coisas que mais me irrita: a quantidade de gente que são fãs de empreendedores celebridades e ainda acreditam em headline de jornalista.

No mercado como um todo existem milhares de pessoas tentando ser o próximo Steve Jobs. Todos os dias. Está claro que só existiu um Steve Jobs, mas no meio de milhares de pessoas tentando, por uma combinação aleatória de fatores, às vezes surgem alguns acidentes de sucesso moderado. Mesmo não chegando ao nível multi bilionário, foi o suficiente pra fazer conseguir ter uma quantidade grande de seguidores sem ter que entregar muito resultado. A grande maioria dos influencers de hoje em dia é isso: gente que nunca de fato entregou nada, mas tem carisma suficiente pra ter fãs. Não vejo nenhum problema nisso, mas só enxergue da forma correta.

Nassim Taleb é quem explica melhor como surgem muitos gurus que você vê por aí. Digamos que você tenha 11 candidatos a guru, em 2013, e nesse exercício a única coisa que eles precisam dizer é se o mercado vai cair ou subir, tipo cara ou coroa mesmo. Estatisticamente, por pura sorte, metade vai acertar e metade vai errar. No ano seguinte vamos considerar ouvir só aqueles que acertaram. De novo, metade vai acertar e metade vai errar e vamos fazendo isso sucessivamente por mais 2 ou 3 anos. Ao final de 5 anos, por pura sorte, vai sobrar uma pessoa que acertou consecutivamente, por 5 anos seguidos, e vamos chamar essa pessoa de “guru”. Bom pra ele, agora que tipo de relevância tem a opinião dessa pessoa pra você? Nenhuma.

A regra é simples, você acha que as pessoas dividem informações realmente valiosas de graça? Se a informação é tão boa assim, quem está falando está aplicando na própria empresa? Ah, ele não tem empresa né? Pois é. Na dúvida, não tenha celebridades de estimação. Não ouça pessoas porque elas foram nominadas “a pessoa mais influente bla bla bla”. Se jornalista fosse tão bom em identificar os reais motivos de um negócio ser bem sucedido no mercado, eles não seriam jornalistas, seriam investidores. O trabalho de um jornalista é vender matéria, se o título vende, ele fez o trabalho dele. E isso não tem correlação com o conteúdo ser bom ou não. De novo, não tem nada de errado nisso, problema seu se acredita. Sempre entenda quais os objetivos de quem escreveu o que você está lendo. Na dúvida, não acredite em mim! Reveja a lógica do argumento e não a pessoa que escreveu. O argumento tem que se sustentar independente de quem está aqui falando pra você. Eu não sou celebridade, nem influencer, qualquer um devia conseguir chegar na mesma conclusão.

E porque nos enganamos tanto? Porque nosso cérebro evoluiu pra procurar padrões e correlações em qualquer lugar, mesmo que não existam. Existem diversas teorias mas se eu for resumir de uma maneira mais informal, nós ainda estamos nos adaptando pra viver num mundo que tem informação demais. Mas o mais importante é sempre lembrar: correlação não é causalidade. Por exemplo, todo grande ditador da história como Hitler, Mussolini, Lenin, Fidel Castro, todos tem barba! Ou seja, todo ditador é barbudo! O erro seria assumir a causalidade e concluir: portanto, todo mundo que tem barba é um ditador em potencial! Soa ridículo, mas vocês fazem esse tipo de generalização o tempo todo! Como já falei antes em associar largar a faculdade como o Gates fez e isso levaria de alguma forma a você ficar mais perto do Gates. É ridículo.

Alguns anos atrás eu publiquei a tradução de um artigo da revista Skeptical Inquirer intitulado Somos Matematicamente Ignorantes, e recomendo que vocês leiam, vou deixar o link nas descrições abaixo. Nós vemos correlações o tempo todo porque com uma quantidade infinita de informações é quase impossível não achar correlações, na verdade o mais comum é conseguir correlacionar qualquer coisa com qualquer coisa. Por exemplo veja este gráfico, segundo esse gráfico podemos ver que existe uma correlação muito grande entre a diminuição do market share do Internet Explorer e a diminuição da taxa de assassinatos nos Estados Unidos. O que podemos concluir disso? Oras, que se você quiser diminuir a quantidade de assassinatos, basta parar de usar Internet Explorer! Ah você já usa Chrome né? Você não se sente melhor agora, tendo colaborado pra diminuir o crime na América?

Ou veja este outro gráfico, aqui vemos que a temperatura global vem aumentando à medida que o número de piratas no mundo vem caindo. Quem diria que o aquecimento global na verdade está associado com a extinção dos piratas. Ou seja, se você quiser colaborar com o fim do aquecimento global, é muito simples, torne-se um pirata! Estão vendo um padrão nisso que estou dizendo? Quantas coisas que você faz que acredita estar ajudando alguma causa na verdade são simples correlações como essa, sem nenhuma causalidade de verdade?

Nosso cérebro quer encontrar essas correlações, em qualquer lugar, padrões, por isso a gente enxerga rostos em nuvens, por exemplo. Obviamente não tem nenhum rosto lá, é apenas uma forma aleatória, mas nosso cérebro quer forçar uma correlação, uma imagem, onde ela simplesmente não existe. E isso era útil de fato, no passado, antes da civilização moderna, onde a gente tinha que dar um jeito de sobreviver no meio do mato, no escuro. Se de repente a gente visse um par de luzes brilhantes no meio da escuridão, a gente fugia! Sem nem considerar se de fato esse par de luzes eram o reflexo dos olhos de um tigre ou se não era nada. Se a gente parasse pra analisar os fatos, podia ser tarde demais. Então a reação de agir primeiro e pensar depois pode ter sido um fator importante na nossa sobrevivência.

Daí vem as teorias do nosso cérebro ter 2 sistemas: um sistema racional e outro sistema intuitivo. Nós achamos que estamos o tempo todo sendo racionais, mas não estamos. Na verdade você nem sabe disso mas seu lado intuitivo controla suas decisões tanto ou mais que seu lado racional. Um experimento do economista comportamental Dan Ariely ilustra bem isso. Ele contou a história sobre um estudo a respeito de doação de órgãos na Europa e como eles notaram que havia uma diferença muito grande entre países que tinham taxa de doação enorme e outros com taxa de doação muito pequena.

E você podia olhar pra esse gráfico e pensar, ah eu sempre soube que esses ingleses esnobes não tem compaixão nenhuma. Mas por outro lado você ia achar países que não são culturalmente tão diferentes como Holanda e Bélgica ou Dinamarca e Suécia. E imediatamente você devia pensar que a cultura e as pessoas não tem nenhuma relação com essa diferença nas taxas de doação. Mas se não era isso, o que causaria tanta diferença assim?

Então eles foram rever os formulários de doação e viram que nos países que tinham baixa taxa de doação como a Dinamarca ou Alemanha a opção no formulário dizia “assinale ao lado se quer participar do programa de doação de órgãos”, daí as pessoas não assinalavam e ninguém participava. Nos países com maior taxa de participação como França ou Portugal, o formulário era diferente, nela dizia “assinale ao lado se não quer participar do programa”, novamente, ninguém assinalava, mas dessa vez todo mundo participava!

Hoje em dia todo mundo de marketing e UX sabe a diferença do que é uma opção opt-in e opt-out, é basicamente arroz com feijão de comunicação e design de interfaces. Inclusive existem leis hoje em dia pra muitas coisas não serem opt-out de má fé. As pessoas tem que conscientemente querer participar de alguma coisa e não estarem todas já automaticamente participando. Mas o ponto é salientar que na maior parte do tempo, você não tá nem aí. Na verdade, seu cérebro não tá nem aí. Você é muito menos racional do que pensa que é, e isso é importante de saber pra parar de automaticamente acreditar em tudo que fazem pro seu cérebro se confundir.

O mito 9 eu já adiantei um pouco quando falei sobre faculdade. Se você não assistiu meu episódio sobre Faculdade, clique no link acima. Muita gente ainda acredita na idéia de participar de eventos de startup ou trabalhar em co-workings por causa do networking. Isso é outro bullshit. Claro, serendípite sempre existe, mas não é uma regra, na verdade é a exceção da regra. A idéia de você estar num co-working e numa conversa de bebedouro você estar encontrando a parceria que precisava pro seu negócio decolar, ou a idéia de que trocar cartões num evento de startup vai trazer contatos importantes.

Tudo isso “pode” acontecer, é verdade. Mas reveja os mitos. Se tudo que você tem é uma idéia, não importa a qualidade dos seus slides de powerpoint. Não importa se você largou a faculdade. Não importa se você conseguiu o cartão de algum investidor bam-bam-bam ou celebridade de palco. Nada disso interessa. Sério, pra que serve você ficar trancafiado brincando de editor de powerpoint num pseudo hackathon em evento de startup pra ganhar um aperto de mão e um certificado no final?? Que experiência você ganha em 2 ou 3 dias varando noite a não ser que você gosta de tomar Redbull?? Você tá com a vida ganha assim pra ficar perdendo tempo nessas brincadeiras? Ou você só tomou pai-trocínio pra ficar indo em pseudo rave? Vai numa rave de verdade, pelo menos tem álcool e drogas de verdade.

Networking de verdade é uma relação de confiança. Eu não tenho nenhum motivo pra confiar em ninguém que eu acabei de conhecer num evento. E certamente tenho menos motivos pra apresentar alguém que eu confio pra alguém que eu acabei de conhecer. Por esse mesmo motivo eu recuso a grande maioria dos convites de amizade no LinkedIn.

Networking de verdade é uma questão de QI, ou famoso “Quem Indica”. Vamos rever o caso do Bill Gates, já que todo mundo gosta de citar ele. Mas ninguém cita a mãe dele: Mary Gates. Vou deixar linkado um artigo sobre ela nas descrições mas basta vocês saberem que ela foi uma mulher de negócios à frente do seu tempo e muito influente em Seattle. Mais do que isso, ela era do mesmo comitê que fazia parte também John Opel, então CEO da fucking IBM em 1980. Como você acha que a pequena Microsoft de Bill Gates naquela época conseguiu o famoso contrato de licença do MS-DOS para ser instalado em todos os IBM PC e que transformou a Microsoft no que ela é hoje?

Aliás, aqui eu estou totalmente especulando mas se não me engano a Microsoft foi fundada no fim dos anos 70 em Albuquerque, Novo México. Mas se mudou pra Seattle, onde a mãe era influente. Coincidência? I think not! Entenda, mesmo sem o empurrão de sua mãe o Bill Gates estava destinado a se tornar milionário, ele era muito à frente dos seus conterrâneos, ele tinha a herança, o pedigree e a formação. Mas foram empurrões como esse que o colocaram no caminho de se tornar bilionário. Todo mundo sabe sobre a parceria de Bill Gates com o outro bilionário Warren Buffet, certo? Quem você acha que insistiu Bill a ir conhecer Warren, mesmo a contra gosto? Sim, Mary Gates. Com todo respeito a todas as mães que tem que aguentar filhos como nós, mas essa foi uma mãe particularmente foda. E isso sim, é networking de verdade.

Finalmente, chegamos no último mito, o mito número 10 e o famoso “você vai ficar rico” se empreender. E sinto dizer, estatisticamente falando, você tem mais chances de dar errado do que dar certo. Na verdade se eu tiver que chutar, eu sempre vou dizer que vai dar errado, porque as chances de acerto pra mim são muito maiores. Desculpe, é a estatística. Mas mais do que isso: tem que ser assim. Empreender não é pra qualquer um. É um risco grande, que tem muito mais fatores que você não tem controle. Então não basta ter um herança familiar sólida, não basta ter pedigree, não basta ter formação, não basta ter competência, você vai ter que contar com fatores aleatórios como ciclos de mercado como eu expliquei no vídeo sobre a Bolha, tem timing, tem que estar no lugar certo na hora certa, tem serendípite, tem QI. Tudo isso, e você ainda não tem garantias de dar certo. Por isso o jogo é interessante e por isso a recompensa é fora do comum, e por isso você tem mais chances depois de acumular conhecimento, experiência, networking de verdade, e principalmente seu próprio dinheiro, depois dos 30 anos do que logo que sair da faculdade, virgem, aos 20 e poucos.

Se você quer só ganhar um salário melhor, com segurança, se torne um bom profissional pra trabalhar em boas empresas. Não há nada de errado nisso, pelo contrário, faça aquilo em que você é bom, não tente ser aquilo que você já sabe que não é só porque fica vendo celebridade de palco repetindo bullshit do tipo “seja seu próprio chefe”.

Se você de verdade tem um ideal de querer ajudar o mundo e acha que virar fundador de tech startup é um caminho, não seja hipócrita. Se pra você ajudar as pessoas é parte fundamental de quem você é, junte-se ao exército, junte-se à cruz vermelha, ao médico sem fronteiras. Não é caminho pra virar celebridade, muito menos rico. Mas segundo você mesmo, seu ideal é ajudar as pessoas e não ficar famoso, não é isso? O meu objetivo pessoal é fazer o que eu quiser, e se o que eu quiser eventualmente ajuda os outros, ótimo.

Pra finalizar, quero contar uma última história praqueles que mesmo depois de tudo que eu falei continuam afobados, com essa ansiedade de virar empreendedor aos 20 e poucos. Eu já contei essa história no meu vídeo sobre Talento, mas vamos lá. Em 1832, a Marinha Real Britânica mandou o navio HMS Beagle para mapear a costa da América do Sul, as Ilhas Falkland e as Ilhas Galápagos. A marinha precisava do conhecimento pra se preparar melhor em caso de guerra. O capitão do navio, que era um cientista amador, decidiu adicionar um geólogo na expedição para estudar formações geológicas que eles poderiam encontrar no caminho.

Depois de diversos geólogos profissionais recusarem o convite, o capitão ofereceu o trabalho a um formando de Cambridge de 22 anos, Charles Darwin. Darwin tinha estudado para se tornar um pastor Anglicano mas estava muito mais interessado em geologia e ciências naturais do que na Bíblia. Ele agarrou a oportunidade, e o resto é história. O capitão gastou seu tempo na jornada desenhando mapas militares enquanto Darwin coletava dados empíricos e formulava os insights que eventualmente se tornariam a Teoria da Evolução.

Se Darwin nunca tivesse nascido, por exemplo, hoje estaríamos atribuindo a Teoria da Evolução a Alfred Russel Wallace que chegou na idéia de evolução via seleção natural independentemente de Darwin poucos anos antes (mas ele não tinha networking, nem vinha de família rica). Por outro lado se os Impérios Europeus não tivessem financiado as pesquisas geográficas, zoológicas e botânicas ao redor do mundo, nem Darwin e nem Wallace teriam tido os dados empíricos necessáriow para desenvolver uma Teoria da Evolução. Pelo menos não naquela época. É mais provável que nenhum dos dois jamais sequer teria tentado.

Entenda, você não tem como planejar “ser o próximo Darwin”. O timing de mercado, no caso o interesse dos impérios em investir nesse tipo de pesquisa, precisou existir. Fatores externos que nós não controlamos. Mas quando a oportunidade surgiu, haviam alguns candidatos que tinham a capacidade de ocupar uma posição de muito trabalho duro. A maioria declinou o trabalho duro mas foi disso que saíram os dados que levariam à revolução. Você não planeja essas coisas, você faz o que tem que fazer, o que sabe fazer e se mantém preparado pra pegar oportunidades assim que elas aparecem, e muitas vezes elas não são bonitas nem agradáveis à primeira vista. Mas como eu já falei em outro vídeo: quem disse que é pra você ficar escolhendo? Depois reclama que não tem oportunidades. Nunca vai existir uma oportunidade que cai no seu colo dizendo “vou te deixar rico em pouco tempo e com pouco esforço”. Só se você achar uma Sugar Mama ou Sugar Daddy.

Pára de ser ansioso. Um Stan Lee criou seu primeiro título de quadrinhos quando estava com uns 39 anos. Foi só depois disso que ele criou o Universo Marvel que você conhece hoje. Samuel L Jackson trabalhou anos em Hollywood mas ninguém conhecia ele direito, e foi só depois de “Jungle Fever” do Spike Lee em 1991, quando Samuel Jackson já tinha 43 anos, que ele finalmente se tornou conhecido. E todos vocês que varam noite, precisam agradecer Momofuku Ando que cimentou seu lugar na história de junk food só aos 48 anos quando inventou o instant ramen em 1958, seu combustível de todas as noites mal dormidas.

Falando em comida, Julia Child trabalhou em advertising e media antes de publicar seu primeiro livro de receitas aos 50 anos, que foi o que a tornou uma chef celebridade depois. Ray Kroc gastou a vida toda como um vendedor de aparelho pra fazer milkshake antes de comprar o McDonald’s aos 52 anos, em 1954 e tornar o gigante que é hoje. Harland Sanders, mais conhecido como Coronel Sanders, tinha 62 anos quando ele franqueou o Kentucky Fried Chickens, o famoso KFC, que ele vendeu por 2 milhões de dólares, 12 anos depois. O famoso Henry Ford criou o igualmente famoso Ford Model T quando ele tinha 45 anos. E como falei antes, Charles Darwin tinha 50 anos quando finalmente publicou o magnum opus On the Origin of Species que mudou o mundo.

Tudo que eu falei no episódio anterior e neste é basicamente um recado simples: pára de querer ficar rico rápido. Se você acreditou em um ou mais dos mitos que eu falei aqui, então você foi enganado, na verdade, você quis se enganar e talvez ainda esteja se iludindo. E sinto dizer que é só isso: uma ilusão, um ticket de loteria. Muito provavelmente você não vai ser o próximo Bill Gates. Aliás, o nome dele é William Henry Gates Terceiro, ele é no mínimo a terceira geração de uma família aristocrata de tradição. Nós não somos. A forma de ultrapassar isso vai ser por sorte. Ninguém vai um dia planejar “vou superar Bill Gates”, fazer um plano, seguir passo a passo e conseguir. Alguém vai superar sim, mas vai ser por acaso, por uma soma de fatores fora do controle dessa pessoa. E, de novo, dificilmente vamos ser eu ou você.

Se você está tentando copiar alguém, seja Gates, Zuckerberg, Elon Musk, Peter Thiel, Kalakanis, ou seja lá qual CEO ou founder de Silicon Valley, você está errado. Quanto mais você me diz que é fã de uma celebridade dessas e tenta seguir o que eles fazem, mais eu diria que você está longe de ser um founder bem sucedido. Atenha-se aos fundamentos. Atenha-se ao seu próprio esforço e pare de perseguir sonhos temporários infantis. Vai por mim, seus sonhos aos 20 anos são completamente dos seus sonhos aos 30 que também vão ser diferentes dos seus sonhos aos 40 e assim por diante. Quem diria, você pode mudar de sonhos toda hora se quiser e nenhum está necessariamente mais certo ou mais errado

A única coisa que você vai conseguir sendo assim é atrair gente que vai te enganar, porque vai vender elementos que encaixam no seu sonho. Vai te alugar lugares caros decorados como Silicon Valley, porque você acha que é pra lá que vai um dia. Vai te fazer perder tempo em eventos com celebridades pra fazer você se lembrar de como quer ser como eles. Vai ter fazer pagar caro por turismo pra visitar a lanchonete do prédio do Google, sério pra que serve isso? Vai te fazer perder tempo criando massa pra fazer parecer que existe um ecossistema de boas startups, mas todo investidor sabe que deve manter várias startups de poucas chance por perto, pra balancear os riscos, basta que uma dê certo. Nenhum investidor está preocupado se 90% falir. Se pelo menos um do portfolio virar unicornio, o resto é descartável. E, de novo, não está errado esse pensamento.

E essa é a verdade sobre o mundo de tech startups. Se ficaram com dúvidas mandem nos comentários abaixo, se curtiram o video mandem um joinha, assinem o canal e cliquem no sininho pra não perder os próximos vídeos. E compartilhem com seus amigos pra ajudar o canal. A gente se vê semana que vem, até mais.

tags: bill gates networking business plan business model charles darwin harvard dan ariely nassim taleb akitando

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