[Akitando] #37 - A Dimensão do TEMPO para Iniciantes em Programação | Série "Começando aos 40"

2019 January 30, 17:00 h

Disclaimer: esta série de posts são transcripts diretos dos scripts usados em cada video do canal Akitando. O texto tem erros de português mas é porque estou apenas publicando exatamente como foi usado pra gravar o video, perdoem os errinhos.

Descrição no YouTube

Este é o 2o episódio da série "Começando aos 40" e hoje quero ajudar a aliviar um pouco a ansiedade dos programadores iniciantes.

Começando agora você não sabe por onde começar. Devo aprender mobile? Devo aprender Web? Se for Web, devo aprender PHP? Ou então Java? Mas e Machine Learnine? E Big Data?

Antes de tentar explicar um pouco desses assuntos vocês precisam entender como chegamos até aqui.

Mais importante, entender porque fazer planos de longo prazo nesta carreira e fixar "ideais" pode não ser uma boa idéia.

É um tema meio "abstrato" mas eu acredito que antes de começar de verdade, seja você um jovem de 20 ou um novo-jovem de 40, vocês precisam entender a dimensão do "TEMPO" na nossa carreira.

Script

Olá pessoal, Fabio Akita

Fiquei muito contente com a recepção do primeiro episódio desta mini-série. Se você ainda não viu clique no link acima e não deixe de ler as histórias das pessoas que comentaram. Recapitulando, a idéia dessa série veio porque me perguntaram, como uma pessoa de 40 anos poderia ingressar neste mercado. Seria muito fácil mandar meia dúzia de links de cursos online e cagar regra do tipo “eu acho que você tem que estudar Python ou Javascript”. Mas ser um programador profissional é muito mais do que isso.

No episódio de HOJE eu quero falar sobre um assunto que alguém de 40 anos provavelmente já tem mais noção e contrastar com alguém de 20 anos que está começando agora. O fator TEMPO. Eu detesto dizer dessa forma porque me faz me sentir MUITO velho, mas preciso pontuar o fato que a maioria dos jovens ainda não tem noção do que TEMPO significa. Vou explicar.

(...)

O tempo é realmente relativo. Mas em outro sentido. Vamos pegar o caso de uma pessoa com 20 anos. Significa que na sua cabeça o conceito de “minha vida inteira” tem 20 anos.

Pra ser mais prático, eu diria que a maioria das pessoas pode desconsiderar os primeiros 10 anos porque era só um bebê ainda, sem muita consciência de si mesmo e do mundo ao redor. Então, na realidade, o que você chama de “sua vida inteira” é a segunda metade: um período extremamente curto de 10 anos.

Se você tem 20 anos agora, nasceu entre 1998 e 1999. Aliás, como alguém twitou no ano novo, este ano marca o fim de todas as crianças ou menores de idade que nasceram no século XX. Todo mundo que tem menos de 18 anos já nasceu no século 21!

Na sua cabeça, 10 anos pode parecer um tempo longo, muito longo, e é lógico, afinal “sua vida inteira” foram só esses 10 anos. Agora, se você é como eu e já está nos 40 anos, então nós já vivemos o equivalente a 2 vidas a mais. Conseguem entender essa dimensão? Tudo aquilo que você de 20 viveu, aprendeu, sofreu, riu e chorou, coube em 10 anos. Nós de 40 vivemos isso 3 vezes já! E o que dizer de quem já tem 50 ou 60 anos? Não vou especular porque eu ainda não cheguei lá, mas a vida é bem mais longa do que parece.

Você de 20, tente se imaginar voltando aos 10 anos de idade, com todas as memórias dos 20, e tendo que repetir tudo de novo mais 2 vezes. Agora vem a primeira armadilha que você vai enfrentar na sua vida: nós somos matematicamente ruins, eu vou falar sobre matemática em outro episódio, mas por hoje só aceite o seguinte: você está pegando “sua vida inteira” de meros 10 anos e projetando no futuro até os 40 ou 50 anos achando que é possível imaginar como você vai ser. Mas isso é impossível.

Aos 20 você está só idealizando seu futuro. Fantasiando. E é tudo uma ilusão. Praticamente nada do que você está projetando pro seu futuro vai se concretizar do jeito que você imagina agora. E se quando chegar aos 40 você olhar pra trás e disser “sim, tudo aconteceu exatamente como eu tinha imaginado aos 20 anos” eu sinto dizer que você provavelmente limitou muito suas opções e viveu muito abaixo do seu potencial.

Veja a razão inicial desta série: dar dicas a pessoas de 40 anos mudando de carreira. Ninguém com 20 imagina que, 20 anos depois, vai estar fazendo uma virada de 180 graus na vida.

Novamente, eu estou generalizando. Cada um teve histórias e circunstâncias muito diferentes, e lógico que é impossível cobrir todos os casos. Mas o fato é que você está congelando sua situação e a situação do mundo ao seu redor e imaginando que o mundo no futuro vai ser mais ou menos parecido com o que é hoje. Você as notícias de possível recessão no mundo, conflitos na faixa de Gaza,a destruição da Venezuela, fome, pobreza, manifestações. E você acha que o mundo sempre foi assim e que sempre vai continuar sendo. Foi o motivo de porque eu falei sobre Hans Rosling no meu vídeo “O mundo hoje é pior?” que você pode assistir clicando no link acima. Mas spoilers: não o mundo está constantemente melhorando. Você vai ter MUITO mais oportunidades amanhã do que tem hoje. Não só um pouco, você vai ter oportunidades inimagináveis e isso vale pra você de 20 e pra você de 40.

Vamos fazer um exercício pra demonstrar isso. Digamos que você tivesse 20 anos em 1985. Nesse ano estávamos saindo da ditadura militar. Estávamos com uma hiperinflação absurda no Brasil que destruía todo nosso poder de compra. A Guerra Fria ainda era uma coisa real. A revolução dos microcomputadores male male tinha 10 anos nesse ponto, os micros mais potentes dessa época eram coisas como o Commodore 64, com poderosos 64 kilobytes de RAM! Modems ainda não eram difundidos e a Internet basicamente não existia. Linux não tinha sido inventado ainda. Windows ainda não existia. MS-DOS ainda era uma novidade. Nessa época assistíamos filmes em fitas Betamax, usávamos fitas cassette e vinil ainda pra ouvir música.

Digamos que o você de 20 anos em 1985 decidisse seguir carreira de programador. Você aprenderia Basic, aprenderia C, talvez Cobol em alguma grande indústria, em breve você estaria aprendendo coisas novas como dBase III ou Clipper ou Dataflex.

Agora vamos pular pra 1995, ano que eu entrei na faculdade e tinha 18 anos. O Plano Real estava sendo um razoável sucesso nesse ponto, tínhamos quase paridade de 1 pra 1 com o dólar, e com a abertura dos mercados na época do Collor em 1991, podíamos importar muita coisa nessa época. O mundo estava diferente já, com a queda do muro de Berlin e o fim da União Soviética também em 1991, as coisas estavam caminhando bem apesar de outras guerras acontecendo como no Iraque de Sadam Hussein. O Windows 95 tinha acabado de ser lançado. A internet comercial estava só começando com cerca de Um Porcento da população experimentando a “ultra” velocidade de modems discados de Cinquenta e Seis kbps. Muitas novidades estavam sendo lançadas nesse ano, como os primeiros navegadores como Netscape, linguagens como Delphi e Java e LiveScript que viraria Javascript. O famoso Macromedia Flash iria sair só no ano seguinte.

Digamos que o você de 20 anos em 1995 decidisse seguir carreira de programador. Você provavelmente iria pro lado de Visual Basic, Visual C, Borland C++, Borland Delphi, talvez quisesse tentar uma carreira em ambiente Unix como Solaris e Java da então amada Sun, ou com minicomputadores IBM programando REXX em OS/2. Web sequer era uma carreira de verdade ainda. Sabe o dBase ou Clipper ou Dataflex de 10 anos atrás? Já estavam no caminho de queda.

De 1995 vamos pra mais 10 anos no futuro, agora você tem 20 anos mas no novo século, em 2005. O mundo era um lugar muito diferente depois do atentado terrorista de 11 de setembro. Nesse momento o mundo web já tinha chegado chegando e explodido na bolha das ponto e muitos até duvidaram sobre o futuro da internet. As redes sociais tinham acabado de começar, Orkut, Friendster, MySpace. Ruby on Rails tinha acabado de ser lançado e ninguém estava dando muita bola. Flash se tornou ubíquito. Estávamos ainda a pelo menos 1 ano da Amazon lançar o AWS, YouTube, Instagram, Pinterest, nada disso existia ainda, e nessa época a Apple já tinha se levantado das cinzas, dominado o mundo com seus iPods, e estava pra iniciar a migração dos processadores PowerPC pra Intel, abrindo o caminho pros desenvolvedores adotarem Macs pra programar.

Digamos que o você de 20 anos em 2005 decidisse seguir carreira de programador. Você provavelmente iria pro lado de C# ou Java ou PHP ou fazer sites em Flash e Wordpress. Navegadores eram todos incompatíveis e coisas como JQuery viraram necessidade na briga entre Firefox e Internet Explorer. O Google Chrome ainda seria lançado só daqui 3 anos, nem o Gmail tinha sido lançado ainda. Sabe o Visual Basic e Delphi e a Borland de 10 anos atrás? Já estavam no caminho de queda.

Nosso último salto é de 2005 pra 2015, mais 10 anos. O mundo mudou completamente pra nós. Passamos por uma das maiores crises econômicas entre 2008 e 2009 que quase levou o mundo financeiro ao colapso. Ao mesmo tempo as redes sociais se consolidaram, Facebook saiu na frente dominando e vários outros como Orkut e MySpace ficaram pra trás. A Apple surpreendeu o mundo lançando o iPhone em 2007, o Google lançando o Android pouco tempo depois e de repente todo mundo já tinha smartphones nos bolsos, uma das adoções de tecnologia mais rápida da história.

A Amazon trouxe o conceito de infraestrutura como serviço e somando ao mundo de smartphones criamos o conceito de “Cloud”. Também por causa do surgimento do mundo mobile e das redes sociais começamos a falar sobre Software as a Service ou SaaS e o mundo de escalabilidade, concorrência e de repente tínhamos mais dados do que poderíamos jamais precisar e inventamos mais ferramentas como a categoria NoSQL de bancos de dados como MongoDB, Redis, Cassandra. E tivemos uma explosão em novas linguagens como Scala. Javascript começou a ganhar relevância quando Steve Jobs matou o Flash e agora todos queriam Apps.

Também de repente todo mundo precisou rebuscar Objective-C pra programar pra iPhones, Javeiros ganharam nova casa em Android, o mundo C# ganhou um boost também em gaming com iniciativas como Unity. Depois de zonear o mundo, Steve Jobs acabaou morrendo em 2011 e com ele as inovações da Apple. A Microsoft finalmente voltou aos eixos com o Windows 10 e a linha Surface. Certamente esses 10 anos foram um dos mais movimentados na nossa história.

Digamos que o você de 20 anos em 2015 decidisse seguir carreira de programador. Você provavelmente estaria ferrado em escolher entre tantas opções. E eu provavelmente estou ferrado também pra explicar mais sobre isso em outros episódios. E isso porque eu nem vou mencionar tudo mais que surgiu entre 2015 e hoje, meros 4 anos.

E vocês acham que a história terminou? Vamos voltar pra década entre 1985 a 1995. Nessa época jovens programadores gostariam de estar escrevendo em revistas especializadas da época como Micro Sistemas ou escrever livros de papel mesmo. Entre 1995 e 2005 acho que muitos estavam fazendo seus websites pessoais, gerenciando grupos de Orkut, e começando a explorar esse troço novo chamado Blogs. De 2005 a 2015 que surgiram vários outros canais como redes sociais, YouTube e cursos online. Agora todo mundo se tornou um semi-profissional nessa nova categoria chamada geração de conteúdo.

Portanto um jovem de 20 anos em 1985 ou 1995 que era o meu caso, jamais poderia imaginar até onde iria a revolução dos microcomputadores e que uma parcela considerável da população mundial teria computadores, muito menos conectados à internet 24 horas por dia. Não poderíamos imaginar que teríamos smartphones e que uma parcela considerável da população mundial teria smartphones. Não poderíamos imaginar que filmes, músicas, livros e todos os conteúdos estariam disponíveis em serviços como Netflix e que um terço do volume de dados trafegados na internet seria deles. Não poderíamos imaginar que as pessoas teriam a opção de se tornar blogueiras ou virar celebridades num canal que viria a ser maior e melhor do que a TV no caso do YouTube. E, no caso de nós programadores, não era simples de imaginar que cada nova linguagem que aprenderíamos numa década se tornaria obsoleta já na década seguinte e teríamos que aprender mais e mais linguagens e tecnologias novas. Entenderam agora porque eu constantemente falo tanto sobre “Aprendendo a Aprender”?

Pra você que tem 20 anos e está entrando agora numa carreira que envolve tecnologia. Veja meus vídeos sobre “Sua Linguagem NÃO É especial”. Apaixone-se pelo processo de aprender e usar as tecnologias, nunca pelas tecnologias em si e as empresas por trás. Nos anos 90 a marca Sun era reconhecida pelos seus produtos inovadores como os workstations, o Solaris, pessoas como James Gosling e Bill Joy. De repente tudo mudou, em 2009 ela foi vendida pra Oracle e desde então ninguém mais se lembra dela. De repente a Apple era um gigante nos anos 80, quase morreu nos 90, fez um retorno triunfante nos 2000 e então estamos na ressaca da morte de Jobs desde 2011. A Microsoft teve altos e baixos iguais, sendo hegemônica nos anos 90, quase se desintegrando no processo anti-truste de 2000, sendo ostracizado nos anos 2000 e perdendo o bonde dos dispositivos de música e smartphones e só agora retornando de forma triunfal. Hoje você é fã do do Facebook, de unicórnios como Uber, Netflix, Spotify.

Toda startup inovadora de ontem se torna o enterprise de amanhã. Entenda essa verdade. A parte cruel de ter sucesso é se tornar quem se queria superar. São ciclos, é assim que as coisas funcionam. Eu conheci o GitHub em 2008, era um escritório pequeno, poucas pessoas. Hoje vale bilhões, basicamente dominou todo o código open source do planeta e foi comprada pela Microsoft. Nada permanece igual por mais de uma década neste nosso mundo de tecnologia.

E essa percepção não é nova, todo mundo falava da famosa Lei de Moore, do grande Gordon Moore, a “lei” que na verdade era só uma observação que o poder de computação dobrava pelo mesmo preço a cada 18 a 24 meses. Essa lei já morreu neste século quando batemos num teto de clock e passamos a adotar multi-cores. Mas existe outro Gordon, Gordon Bell e a Lei de Bell de 1972 que descreve como classes de computadores se formam, evoluem e podem eventualmente morrer.

Bell considera essa lei parcialmente um corolário da Lei de Moore. A definição é: Mais ou menos a cada década uma nova classe de computadores de menor custo se forma baseada em uma nova plataforma de programação, rede e interface resultando em uma nova usabilidade e o estabelecimento de uma nova indústria.

A Lei Bell fala sobre uma nova classe de computadores, e pode ser do mainframe pros minicomputadores para workstations para desktop para dispositivos móveis pra cloud computing e assim por diante. Faz 50 ou 60 anos que isso vem acontecendo, e só na minha curta história de 4 décadas eu diria que vi isso acontecer com meus próprios olhos. Não acredita em mim? Se você tem 20 anos talvez não tenha essa memória tão viva, mas se você tem 40 certamente vai se lembrar de quando em 2005 o Papa Benedito 26 foi escolhido, essa era a multidão assistindo no Vaticano. Então, menos de 10 anos depois, ele resignou e em seu lugar um novo papa foi escolhido, Papa Francisco, e esta é a multidão no Vaticano em 2013. Sim, o mundo mudou, e ele vem mudando constantemente.

A vocês de 20 anos fica a dica: planeje sua carreira mas estabeleça planos ou objetivos fixos. Você tem a fantasia de viver sendo feliz e fazendo as coisas que gosta, seja lá o que isso for, e eu já expliquei no meu vídeo “Procure o que você Ama, só que não” porque esse pensamento vai limitar suas opções.

A vocês de 40 anos, vou só confirmar o que vocês já sabem: a vida muda. Vocês provavelmente já entenderam que o importante não é fazer o que ama, mas amar o processo e aproveitar as chances que a vida vai te dando, sem ficar olhando muito pra trás. Por alguma razão os jovens tem vivido mais no passado do que os mais velhos, olhando muito pros nomes e ideologias falidas do passado. Livrem-se de ideologias e dogmas, elas não servem pra nada, pois quem vive de museu é passado.

Vou repetir, sua linguagem de programação não te define. As empresas de tecnologia não te definem. Seu salário atual não te define. Suas ideologias nunca deveriam te definir, porque você vai mudar todas elas em breve. Seus objetivos não te definem, porque à medida que o mundo vai mudando, seus objetivos vão mudar também. A única coisa que é constante é gostar do jogo e gostar do seu próprio esforço, seja lá no que esteja fazendo.

O objetivo do episódio de hoje era dar perspectiva. Antes de eu sair dizendo “vá aprender tecnologia X ou vá fazer curso Y” eu acho importante que todos você entendam onde vocês estão, no espaço e no tempo. Essa perspectiva vai ajudar vocês a terem mais dimensão. Quando você se pergunta, será que estou atrasado? Será que ainda tem tempo? Será que estou indo muito devagar? Pare pra pensar na perspectiva desse episódio. Talvez, talvez você esteja atrasado, pra década passada, mas uma nova década já se abriu.

No próximo episódio prometo que vou começar a tocar em alguns assuntos mais práticos tanto pro curto quanto pro longo prazo. Não deixem de assinar o canal e clicar no sininho pra não perder, se curtiram mandem um joinha e compartilhem suas histórias de perspectiva nos comentários abaixo. A gente se vê semana que vem, até mais!

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