O resto do espaço entre o hall de entrada e o teatro foi dividido em duas enormes áreas abertas. A principal, que dá acesso ao teatro foi chamado de Startup Alley, uma grande exposição de Startups, a maioria dos Estados Unidos. O resto do espaço foi organizado entre alguns países. Usando uma fração da área principal do Startup Alley, estavam os pavilhões de Israel e Coreia do Sul. Esse grande espaço pode ser considerado a área nobre pois é onde a maioria das pessoas transitava entre o hall de entrada e o teatro.
Na área menos movimentada ficava o maior pavilhão internacional, o brasileiro, com cerca de 30 Startups brasileiras expondo. No mesmo espaço mais ao fundo ficaram o resto dos países como Argentina, Chile, México e até uma solitária, embora animada, Startup do Japão. Os momentos mais movimentados nessa região era somente durante almoço e intervalos para lanche, porque as mesas de comida eram montadas no meio de todos os pavilhões.
De qualquer forma, o lugar em si era gigante. Não sei a contagem exata, mas tranqüilamente cabiam pelo menos 3 mil pessoas ao mesmo tempo. Não era um evento pequeno. Para mais detalhes, vocês podem ler a cobertura da própria Techcrunch, o resto será minha impressão pessoal.
Basta começar dizendo que de todas as intenções de visita que eu tinha meses antes de decidir ir, não havia pensado nenhuma vez no Disrupt. Portanto minhas expectativas não eram grande coisa. Imagino que para as Startups expondo a missão foi cumprida pois o que eles buscavam era uma chance de expor seu produto a possíveis investidores. Não importava tanto o volume de pessoas assistindo, mas a qualidade dos seus cartões de visita. Como meu objetivo não era expor, fui com um olho mais de exploração.
Eu sou bem chato com definições, quando leio a palavra "Disrupt", assumo a definição do dicionário: "que drasticamente altera ou destrói uma estrutura de alguma coisa." Com isso em mente, já devem imaginar qual será minha opinião do evento.
Do ponto de vista de quem estava em busca de idéias disruptivas ou inovadoras digo que fiquei bem decepcionado. Gastei os três dias percorrendo cada uma das Startups que estavam expondo já que todos os dias eles rotacionavam as startups do Alley, e quase nada chamou minha atenção. Vejam por vocês mesmos na lista de startups disponível no site do evento. Certamente haverá muitas interessantes de se ver, mas "disruptivas"?
Além das startups que rotacionavam todos os dias no Alley, havia uma área permanente nos 3 dias onde uma seleto grupo escolhido antecipadamente pelo Techcrunch estava expondo. Era o "Startup Battlefield". Não estava muito por dentro de como se deu essa seleção, mas eles tinham espaço privilegiado e apresentações para juízes que iriam julgar quem era o melhor até o fim do evento.
Na minha opinião o mais inovador foi o LitMotors, um veiculo de dois pneus equipado com giroscópios e um sistema que, em teoria, impede esse veículo de tombar, mesmo estando em duas rodas e mesmo se um carro bater em sua lateral na rua. Difícil dizer sua viabilidade enquanto negócio, mas seus fundadores parece que vieram do mercado automobilístico, o que me indica alguma credibilidade e conhecimento de causa. E a implementação técnica do protótipo parece já ter sido bem sucedida. Seria um veiculo urbano para curtas distancias que eu consideraria adquirir.
Podemos tentar dividir o que vi em categorias. E se tinha uma que estava excessiva eram as misturas de redes sociais com classificados. Vi mais de um produto de empregos e recomendações. Vi mais de um site de relacionamento (sim, pois é!). Vi mais de um site de e-Learning. Acho que já deu para entender que foi bem repetitivo.
Uma grande categoria eram os clones de produtos que já existiam. Tenho certeza que vi vários que poderiam ser descritos como "dropbox corporativo", Google Docs, e-commerces em geral. Haviam alguns divertidos até, por exemplo, um e-commerce de óculos onde você usa um aplicativo de iPad que mapeia seu rosto num modelo rudimentar 3D para conseguir encaixar modelos virtuais dos óculos à venda. Então você pode girar sua cabeça para ver como os óculos ficam no seu rosto, como num espelho virtual. Mais uma variação de realidade aumentada.
O que mais eu vi foram derivações simples de coisas que já existem. Lembram como falei de amálgamas de redes sociais e classificados? Pois bem, uma das Startups que inclusive ganhou um prêmio no evento foi o Your Mechanic. Imaginem um jeito online de encontrar mecânicos e poder dar notas, além de procurar por reputação ...
Nada contra derivações, muitas são até mesmo úteis e, se você tiver os contatos corretos fundados no mundo real, pode até oferecer uma barreira de entrada para evitar outros clones. Por exemplo, um que parecia simples mas que precisa de um trabalho não tecnológico pesado foi um aplicativo que organiza cupons de desconto no seu smartphone, chamado Gyft. Nada demais do ponto de vista de programação, afinal não há nada de mais em uma mera carteira virtual com cupons digitalizados, que funciona assim como muitas outras que já existem (como o próprio Passbook do iOS 6). O importante aqui não tem a ver com programação, mas com as parcerias com as diversas cadeias varejistas para integrar com os sistemas de cupons. Bem articulado, de fato existe potencial pra conseguir um alto faturamento. Nada de inovador ou disruptivo, mas um modelo de negócio que espertamente uniu pontas de um mercado que já existe.
Mesmo não sendo um evento especificamente de tecnologia, havia algumas Startups focados em tecnologia, mas que tinham pouco destaque pelo público por justamente não ser um evento voltado para programadores ou engenheiros. Um grande amigo meu, Andrew, e seus amigos lançaram uma tecnologia para smartphones e tablets que permite desenvolver aplicativos em HTML 5 e CSS 3 utilizando os aspectos de aceleração por hardware para conseguir renderizar interfaces complexas mais rápidas e fluidas. Ainda quero ver até onde essa técnica pode ser explorada. Coloque o nome famo.us no seu radar.
Também conversei com outra startup chamada FoundationDB que lançou mais um ("yet another ...") banco de dados NoSql cuja proposta era oferecer armazenamento de dados não estruturados, com qualidades de facilidade de replicação, tolerância a falha e, uma das características mais importantes: ser Acid como em bancos de dados relacionais tradicionais. Porém, se não se tornar open source, não apostaria minhas fichas.
Uma startup chamada DaVinci estava oferecendo uma ferramenta para ajudar desenvolvedores a desenvolver aplicativos iPhone de forma mais simples (talvez interessante para aplicativos simples), que não deixam de ser concorrentes a um PhoneGap ou Titanium. Outras como a FatFractal estavam oferecendo Platform as a Service concorrentes com Heroku ou CloudFoundry. Outra chamada BrightContext era um serviço de Websockets as a Service, mais ou menos como meu favorito, Pusher, mas com funcionalidades extras, como pré-processamento de mensagens.
Tecnologias interessantes, mas como disse antes, derivações de produtos que já existem. É fácil distinguir quando se consegue descrever em poucas palavras usando outros já existentes como referência. Por exemplo, "parecido com eHarmony", "Riak com Acid", "Pusher com ETL", "concorrente de PhoneGap", etc.
O terceiro e último dia do evento deu espaço para menos Startups no Alley e com temas voltados a hardware. Vi algumas coisas interessantes, como por exemplo mais uma tentativa de tornar acessível uma impressora 3D (isso é uma tendência que estou curioso para ver para onde vai), um skate motorizado (não diferente de muitas que já existem), uma pistola para conectar iPhone e virar um tipo de paint ball virtual (Zillion virando iPhone), uma câmera polaroid conectada a um iPhone (inútil) e coisas desse tipo. Novamente, divertido de se ver, mas pouca coisa que prática.
Isso resume em poucas palavras os tipos de Startups que vi. Nada muito diferente disso. É uma sensação que de vez em quando me fazia pensar se era eu quem estava sendo muito exigente. Afinal eu sei que não estávamos num evento de "invenções". Alguns poucos tinham modelos de negocio viáveis, embora a maioria me parecesse bem descartável. Vou manter alguns deles em mente e verificar daqui um ou dois anos para ver quais sobreviveram e quais efetivamente conseguiram se tornar negócios de grande sucesso. Se tivesse que apostar, apostaria em menos de 5% do que vi, se muito.
Uma coisa que eu tinha em mente é que aqui do Brasil nós só conhecemos as Startups que já deram certo e por isso estão na mídia. Eu queria ver as Startups que ainda estão começando, que não se provaram e portanto não apareceram o suficiente para chamar nossa atenção. Mas depois do que vi, acredito que não vamos ver a grande maioria deles novamente.
Como se isso não bastasse, a maioria das palestras e painéis que aconteceram o dia todo, nos três dias, no teatro não foram bons. Não posso dizer que todos foram assim, mas a julgar pelo que assisti, não estou errando por muito. E isso foi uma pena, especialmente porque os nomes na programação eram estelares, incluindo personalidades peso-pesados como Reid Hoffman, Marissa Meyer, Bill Campbell, Ben Horowitz, Biz Stone.
Fiquei desanimado logo no inicio, ao assistir o Keynote do Jack Dorsey, um dos fundadores do Twitter e agora no Square. Sua qualidade como empreendedor é comprovada, mas sua palestra foi excessivamente motivacional, coisa que esperaria ver num evento para estudantes, não em algo do calibre de um Disrupt. E para corroborar sobre essa minha primeira má impressão, assistir o painel do Michael Arrington entrevistando Marc Benioff, fundador da super potência que é o SalesForce.com, foi particularmente irritante. Muito assunto supérfluo, como o Marc falando de bungee jump.
Eu não imaginava que seria diferente, mas também assisti a despreparada (embora linda de se ver pessoalmente, claro) Jessica Alba falando da sua Startup The Honest Company que - surpresa - vende produtos para bebês. Toda resposta era altamente genérica, como se ela não tivesse decorado o texto direito. Nem estou tentando dizer que ela não trabalha de fato nesse negocio, apenas que suas respostas dão mais sustentação à hipótese de que não, e de que é apenas uma celebridade associada a uma marca para alavancar as vendas, por exemplo. Brian Lee, pelo menos, cobria com respostas melhores toda vez.
De longe, a única coisa que conseguiu uma reação impressionada minha foi o painel do Michael Arrington entrevistando Marc Zuckerberg. Foi o painel que mais lotou, e quando o Arrington jogou como primeira pergunta um soco de direita do tipo "o que acha da desvalorização das ações do Facebook" ficou claro que esse painel seria diferente. E quando Mark respondeu tranqüilamente, sem gaguejar, com confiança, ficou mais claro ainda para mim o pensamento "as ações vão subir agora". Não digo que o conteúdo em si foi algo impressionante, mas sim a forma como o Mark foi consistente, decisivo e assetivo nas suas respostas. E como imaginávamos, poucos minutos depois da entrevista ouvíamos as notícias de que de fato as ações do Facebook cresceram quase 9%. Foi o ponto alto de todo o evento.
E para mim pessoalmente, o ponto baixo foi ver uma Startup como Your Mechanic ganhar como melhor Startup do show e a LitMotors ficar como runner up. Mas também, "what the hell do I know?"