Imagem Utópica de Software Livre e Código Aberto do Brasil em Risco

2007 January 25, 04:45 h

O mundo acha que o Brasil é um exemplo de nação livre. Brasileiros acham que o Brasil é um exemplo de nação livre. Poucos conhecem a verdade embora saibamos que a maioria que se diz defensor de software livre na realidade confunde “Liberdade” com “custo zero” – principalmente se forem vozes vindas de empresas públicas, privadas e do Governo Federal, o último lugar no mundo onde alguém saberia diferenciar “Liberdade” de “Libertinagem”.

Apesar da imagem errada que o marketing brasileiro vendeu ao mundo, alguns formadores de opinião estão começando a se dar conta da falácia brasileira, como podemos ver nesta matéria. Se ela está totalmente correta ou não, é irrelevante: o problema existe e desviar as atenções a detalhes não muda esse cenário e nem os riscos ao futuro.

Fonte: Linux.com, por Bruce Byfield

De acordo com a mídia internacional, o Brasil é um líder na adoção em software livre e código aberto (FOSS). O New York Times descreve o país como uma “área tropical de movimento de software livre”, enquanto o BBC News afirma que “cada vez mais os ministérios do governo do Brasil e empresas estão abandonando Windows em favor de software ‘livre’ e de ‘código-aberto’”. Entretanto, defensores de FOSS familiares com o Brasil descrevem uma situação mais desesperançosa.

A conversa sobre suporte não-sistemático pelo governo e uma atmosfera de negócios onde uma menção a FOSS é mais barulho do que entendimento sobre a filosofia por trás. Eles dizem que violações ao GNU General Public License são comuns. Algumas adoções genuínas de FOSS acontecem, eles dizem, mas normalmente, é casada com ineficiência e possivelmente com corrupção espalhada.

Durante o primeiro governo de Lula, que começou em 2003, adoção FOSS foi anunciada como uma política principal. Em adição a encorajar governos estaduais e federal para mudar para FOSS, o governo Lula também usou FOSS no PC Conectado, um programa para fazer computadores baratos disponíveis para o público brasileiro. O anúncio dessas iniciativas criaram a impressão internacionalmente que o Brasil logo se tornaria um exemplo de adoção FOSS para o resto do mundo.

Entretanto, não somente essa promessa de potencial ainda está para ser entendido, mas existem sinais que política pró-FOSS estão travando. Quando Lula foi re-eleito no fim de 2006, sua plataforma de partido continha somente uma breve referência à software livre – uma promessa geral de “melhorar serviços diretos remotos aos cidadãos, simplificando procedimentos, treinando servidores civis e aumentando a base tecnológica, incluindo a utilização de software livre”. Nenhum dos planos anteriores para FOSS estava em evidência. Possivelmente, essa desenfatização de FOSS foi por causa do aumento da oposição por interesse em software proprietário, tal como um desafio constitucional no estado do Rio do Sol (?) contra uma lei dando preferência a soluções FOSS no governo.

Seja qual for o caso, defensores brasileiros aprenderam a ser céticos sobre promessas de FOSS. Por exemplo, embora a Conectiva (agora Mandriva) espalhou o anúncio de um acordo com o integrador de sistemas Positivo que resultou em mais de 90 mil computadores distribuíos com Conectiva instalado, o desenvolvedor Debian, Gustavo Franco, sugere que “quase todos os usuários instalaram cópia de Microsoft Windows sobre eles”. Franco não tem como substanciar sua afirmação, mas seu argumento é que brasileiros de baixa renda não querem software livre tanto quanto se vê na TV ou em comerciais. Mesmo que sua sugestão não seja completamente verdade, ele reflete a estranhesa que defensores aprenderam através de experiência amarga.

Interesse em FOSS ainda existe pelo Brasil, mas sinais de progresso são difíceis de ver em 2007. “Existe um monte de gente fazendo nada mais do que falar muito”, diz o desenvolvedor Debian Otavio Salvador.

Barulho em vez de Qualidade

Alguns sinais de adoção FOSS ainda são visíveis pelo Brasil, mas observadores FOSS estão preocupados sobre a qualidade do código sendo liberado e onde os esforços estão sendo aplicados.

Gustavo Noronha Silva, outro desenvolvedor Debian, nota que o plano do ministério federal é desenvolver um sistema de inventório chamado CACIC sob o GNU General Public License em parceria com um companhia pública chamada Dataprev. “O código não é tão bom assim”, ele diz, “mas estão trazendo os conceitos de software livre no governo, e estão lançando código real e dando manutenção neles”.

Similarmente, o Instituto Nacional de Tecnologia da Informação, uma companhia de software do governo, e a SERPRO, o serviço oficial federal de processamento de dados, desenvolveram alguns cursos de software livre e ajudaram na migração de alguns departamentos governamentais para FOSS. “Eu fiz parte em alguns processos quando gerenciava a TI de um dos ministérios”, disse Silva, “e eu pude ver que seus trabalhos era de qualidade bem baixa, sem nenhum planejamento”.

Silva cita um caso onde pacotes de códigos eram construídos sobre os pacotes do Debian e workstations Debians misturados com conexões rdesktop baseados em Windows. E outro caso onde serviços de e-mails eram migrados sem preocupação com a infraestrutura existente. “Eles fizeram muitos estragos”, diz Silva.

Em outro caso, CAIXA, um dos maiores bancos públicos brasileiros, implementaram seu próprio sistema operacional baseado em Debian. Silva diz que o sistema “basicamente quebra se tentar atualizá-lo, então é impossível de usar com sanidade em servidores” – embora esse é o lugar onde a CAIXA está usando. Ele nota, entretanto, que o lançamento do software foi anunciado “em uma grande conferência com montes de cabeças de TI do governo”. A preocupação de Silva é que esse tipo de esforço vai desacreditar todo o conceito de FOSS por causa da baixa performance e representará um triunfo de marketing em vez de considerações técnicas.

Similarmente, Franco está preocupado sobre planos do governo de comprar laptops do projeto One Laptop Per Child (Um Laptop por Criança). “Acho que o projeto é uma boa idéia”, diz Franco, “mas o objetivo do governo é colocar os laptops nas mãos dos professores” em vez de distribuí-los para os cidadãos de baixa renda como era a intenção do projeto.

Franco também menciona rumores que algumas das outra tentativas de entregar computadores baratos no Brasil “junta hardware de qualidade duvidosa com uma distribuição Linux aleatória que não suporta completamente esse hardware”.

As preocupações de Silva e Franco são que tais esforços vão desacreditar todo o conceito de FOSS por causa de passos errados e performance pobre. O fato que algumas iniciativas do governo são patrocinadas por companhias multinacionais como IBM e Cisco apenas poderiam aumentar o desastre para FOSS. “O barulho sobre FOSS no Brasil é coisa de marketing”, escreve Franco em seu blog e, reservadamente, Silva ecoa esse sentimento no NewsForge.

O software mas não o espírito

Defensores estão ainda mais preocupados sobre as prioridades por trás da adoção FOSS. O conceito de software livre tem tantas conotações positivas que ambos o governo e companhias privadas gostariam de estar associadas nisso. Mesmo assim, na prática, muitos estão mais preocupados com o custo grátis do que com a filosofia de liberdade. Em muitos projetos FOSS brasileiros, bloga Franco, “ninguém fora do escritório de projeto (quando existe um) chega a ver algum código fonte”, mesmo que compartilhar código seja o coração das comunidades FOSS.

De fato, muitas companhias desenvolvendo e vendendo software livre no Brasil parecem estar violando a seção 3 do GNU General Public License (GPL), que requer que eles ou deixem seu código fonte disponível ou ofereça publicamente fornecê-lo. Companhias desse tipo incluem Kurumin, uma distribuição largamente instalada por novos usuários, assim como Poseidon e Kalango, dois derivados de Kurumin, Blane e Dual O/S (antes conhecida como Freedows). Nenhuma dessas distribuições parecem oferecer o código fonte em nenhum lugar de seus sites.

De acordo com Franco, a razão do Kurumin não fornecer o código fonte é que seus desenvolvedores afirmam que a distribuição usa apenas fontes Debian originais. “Isso não é verdade”, insiste Franco. Entretanto, mesmo que fosse, as distribuições ainda estariam obrigadas a fornecer seu próprio código fonte. Muitas outras distribuições na mesma posição foram encontradas que são incompatíveis com a Free Software Foundation, e não existe nenhuma razão para pensar que Kurumin ou qualquer outra distribuição brasileira seriam exceções.

Mais ainda, Franco nota que o acordo de usuário do Kurumin contém uma provisão dizendo que usuários que processarem os desenvolvedores da distribuição “perdem o direito de usarem ‘seu’ software”. Similarmente, Dual O/S inclui uma cópia de teste que expira depois de 240 horas de uso. Ambas as restrições violam aspectos adicionais do GPL, incluindo a Seção 4 contra sub-licenciamento e o requerimento da Seção 6 onde o distribuidor passa adiante os direitos do GPL para usuários seguintes.

Franco também menciona Plurall, um projeto de thin client, como violando o GPL por não liberar o código fonte. Entretanto, Ricardo Prado Schneider, da emrede, a organização não-governamental desenvolvendo Plurall, diz a NewsForge que um repositório contendo o código fonte será liberado em breve …

Defensores do FOSS estão preocupados que, em vez de agir sobre esses problemas, companhias e projetos brasileiros estão tentando redefinir o software livre para seus próprios propósitos. Silva aponta para a licença desenvolvida pelo estado do Paraná, que é incompatível com a definição de Software Livre. A FSFLA, a organização Sul Americana irmã da FSF, está tentando pegar a licença alterada, mas comentários como de Omar Kaminski, um dos rascunhadores da licença, que o “GPL é incompatível com a legislação brasileira”, e que “talvez software livre no Brasil está se movendo em uma direção diferente dos Estados Unidos”, fazem pouco para reduzir as preocupações de defensores do FOSS.

Franco se preocupa que, se a tendência atual continuar, o movimento FOSS no Brasil “não será orientada a comunidades, mas alguma coisa sendo gerenciada por companhias bem pagas. Detalhes e códigos fonte não estarão disponíveis. De certa maneira isso já está acontecendo, mesmo que em menor escala”.

Corruptos ou ignorantes?

Alguns esforços FOSS no Brasil realmente parecem ser genuínos. Silva cita Mandriva como um exemplo. A distribuição Insigne também parece estar compatível com o GPL e, embora lançamentos anteriores fossem de baixa qualidade, as mais recentes parecem estar muito melhores. Silva também sugere que muitos brasileiros, individualmente, estão fazendo contribuições para software livre, embora a maioria “já estava trabalhando antes desse barulho começar”.

“Muitas instituições do governo, ONGs, e companhias estão usando a imagem FOSS e seus argumentos com as massas para fazer o que os Brasileiros fazem melhor”, diz Franco: “Corrupção”.

Em contraste, Silva sente que o problema “é relacionado na maior parte a caronistas e pessoas que são boas em comunicar coisas que elas não entendem. Eu até mesmo implicaria corrupção. Eu não vi evidência de algo assim relacionado a software livre. Eu mencionaria incompetência, caronistas e falta de conhecimento”.

Mesmo assim, uma coisa é certa: a imagem do FOSS brasileiro no resto do mundo está fora de sincronia com o que está acontecendo. “O que está sendo dito ao mundo não é exatamente a verdade”, diz Franco.

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